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O Sangue do Olimpo - CAP. XXI

.. segunda-feira, 17 de novembro de 2014
Capítulo XXI - Reyna

PELO MENOS ELES NÃO FORAM parar em outro navio de cruzeiro.
Ao saírem de Portugal, tinham aterrissado no meio do Atlântico, onde Reyna passara o dia inteiro no convés do Azores Queen afastando criancinhas da Atena Partenos – elas pareciam achar que a estátua era um toboágua.
Infelizmente, o salto seguinte levou Reyna para casa.
Eles surgiram a três metros do chão, flutuando sobre a área aberta de um restaurante que Reyna logo reconheceu. Ela e Nico caíram em cima de uma enorme gaiola, que se quebrou no ato, jogando-os – junto com três araras muito assustadas – em um amontoado de vasos de samambaias. Já o treinador Hedge caiu em um toldo que cobria um bar.
A Atena Partenos aterrissou de pé, com um sonoro BUM, esmagando uma mesa e jogando para o alto um guarda-sol verde-escuro, que foi parar em cima da estátua de Nice na mão de Atena. No final, parecia que a deusa da sabedoria segurava um drinque tropical.
— Aaah! — berrou o treinador Hedge.
O toldo se rasgou, fazendo-o cair atrás do bar. Foi um estardalhaço de garrafas e vidros se quebrando. Ele se recuperou bem: ressurgiu por trás do balcão com uma dúzia de miniguarda-chuvas no cabelo, pegou a pistola da máquina de refrigerante e serviu um copo para si mesmo.
— Gostei! — exclamou ele, jogando um pedaço de abacaxi na boca. — Mas será que da próxima vez podemos aterrissar logo no chão e não em pleno ar?
Nico saiu se arrastando do meio das samambaias e desabou na cadeira mais próxima, espantando uma arara azul que tentava pousar em sua cabeça. Depois da luta contra Licáon, tinha jogado fora sua jaqueta de aviador, toda rasgada. O estado da camiseta preta com estampa de caveira não era muito melhor. Reyna tinha costurado os cortes de Nico na altura dos bíceps, o que o fazia parecer um tanto assustador, uma espécie de Frankenstein, mas os ferimentos continuavam inchados e vermelhos. Ao contrário das mordidas, garras de lobisomem não transmitiam licantropia, mas Reyna sabia, por experiência própria, que demoravam a sarar e queimavam como ácido.
— Preciso dormir. — Nico olhou ao redor, confuso. — Estamos em segurança?
Reyna observou o pátio do restaurante. O lugar parecia deserto, embora ela não entendesse por quê. Àquela hora da noite, deveria estar lotado. O céu noturno emitia um brilho nublado cor de cerâmica, a mesma cor das paredes do prédio. As sacadas do segundo andar, em torno do pátio, estavam vazias, exceto por vasos de azaleias pendurados nas grades brancas de metal. Por trás de uma parede de portas de vidro, o interior do restaurante estava às escuras. O único som era o gorgolejar solitário da fonte e o ocasional grito de uma arara mal-humorada.
— Aqui é o Barrachina — disse Reyna.
— Viemos parar na China? — perguntou Hedge, abrindo um vidro de cerejas ao marasquino e começando a comer.
— Barrachina. É um restaurante famoso — explicou Reyna. — Fica bem no meio de Viejo San Juan. Acho que foi aqui que inventaram a piña colada, na década de sessenta.
Nico se levantou da cadeira, deitou-se encolhido no chão e já começou a roncar.
O treinador Hedge soltou um arroto.
— Bem, parece que vamos ficar aqui por um tempo. Se eles não inventaram nenhum drinque novo desde os anos sessenta, estão atrasados. Vou começar agora mesmo!
Enquanto Hedge remexia nos utensílios atrás do balcão do bar, Reyna chamou Aurum e Argentum com um assovio. Os cães pareciam desgastados devido à luta contra os lobisomens, mas Reyna os deixou de vigia. Verificou a entrada que dava para a rua. Os portões decorativos de ferro estavam trancados. Uma placa em espanhol e inglês avisava que o restaurante tinha sido reservado para uma festa particular. Aquilo parecia estranho, já que o local estava deserto. No canto da placa estavam gravadas as iniciais HDVM. Isso incomodou Reyna, embora ela não conseguisse identificar o motivo.
Ela espiou através dos portões. A rua Fortaleza encontrava-se estranhamente silenciosa, e o calçamento de pedras azuladas, totalmente livre, sem nenhum pedestre nem carro passando. As fachadas das lojas em tons pastel estavam fechadas e às escuras. Seria domingo? Ou algum tipo de feriado? A sensação de desconforto de Reyna só aumentava.
Atrás dela, o treinador Hedge assoviava alegremente enquanto preparava algo em vários liquidificadores enfileirados. As araras estavam pousadas nos ombros da Atena Partenos. Reyna se perguntou se os gregos ficariam ofendidos se sua estátua sagrada chegasse coberta de cocô de aves tropicais.
Tantos lugares em que Reyna podia ter ido parar... e logo San Juan. Talvez fosse coincidência, mas ela não acreditava nisso. Porto Rico não ficava no caminho entre a Europa e Nova York. Eles fizeram um bom desvio para o sul.
Além disso, ela estava emprestando sua força para Nico havia alguns dias. Talvez o tivesse influenciado inconscientemente. Ele era atraído por pensamentos dolorosos, medo, escuridão. E a recordação mais dolorosa e sombria de Reyna era San Juan. Seu maior medo? Voltar ali.
Os cães perceberam sua agitação. Rondaram o pátio, rosnando para as sombras. O pobre Argentum andava em círculos por causa da cabeça deslocada, para conseguir enxergar com o olho de rubi que lhe restava.
Reyna tentou se concentrar em lembranças positivas. Sentia saudades do barulho que os pequenos sapos coquí faziam, cantando pelas ruas como um coral de tampas de garrafa se abrindo. Tinha saudades do cheiro do mar, das magnólias e dos limoeiros em flor, do pão fresco das panaderías locais. Até a umidade do ar lhe era confortável e familiar, como o jato de ar perfumado das secadoras de roupas.
Parte dela queria abrir os portões daquele restaurante e sair explorando a cidade. Ela queria visitar a Plaza de Armas, onde os velhinhos jogavam dominó e o quiosque de café vendia um espresso tão forte que fazia suas orelhas doerem. Queria passear pela rua onde tinha morado, a San José, contando os gatos de rua e dando-lhes nomes, inventando uma história para cada um, como fazia com sua irmã. Queria invadir a cozinha do Barrachina e preparar um verdadeiro mofongo, com bananas, bacon e alho – um sabor que sempre a lembraria de tardes de domingo, quando ela e Hylla conseguiam escapar de casa por um tempo e, com alguma sorte, comer ali naquela cozinha, onde os funcionários já as conheciam e se compadeciam delas.
Ao mesmo tempo, porém, Reyna queria ir embora dali imediatamente. Queria despertar Nico, por mais cansado que ele estivesse, e forçá-lo a transportá-los para longe dali, para qualquer lugar que não fosse San Juan.
Estar tão perto de casa a deixava tensa como um arco de balista.
Ela olhou para Nico. Apesar da noite quente, ele tremia no chão de lajotas. Ela pegou um cobertor da mochila e o cobriu. Reyna não tinha mais vergonha de querer protegê-lo. Para o bem ou para o mal, eles agora tinham uma ligação. Cada vez que viajavam nas sombras, a exaustão e os tormentos dele transbordavam sobre ela, e Reyna o entendia um pouco melhor.
Nico sentia uma solidão arrasadora. Tinha perdido a irmã mais velha, Bianca. Tinha afastado todos os semideuses que haviam tentado se aproximar dele. Suas experiências no Acampamento Meio-Sangue, no Labirinto e no Tártaro haviam lhe rendido cicatrizes e o deixado receoso de confiar em qualquer um.
Reyna duvidava que fosse possível mudar os sentimentos dele, mas queria ao menos lhe dar apoio. Era algo que todos os heróis mereciam. E esta era exatamente a ideia da Décima Segunda Legião: unir forças para lutar por uma causa mais importante. Você não estava sozinho. Você fazia amigos e conquistava respeito. Mesmo quando não parava de lutar, você ainda tinha um lugar na comunidade. Nenhum semideus deveria sofrer sozinho, como Nico sofria.
Era vinte e cinco de julho. Faltavam sete dias para primeiro de agosto. Em teoria, era tempo suficiente para chegar a Long Island. Quando completassem a missão – se completassem – Reyna faria o que pudesse para garantir que Nico fosse reconhecido por sua bravura.
Ela tirou a mochila do ombro. Tentou colocá-la sob a cabeça de Nico como um travesseiro improvisado, mas seus dedos o atravessaram como se ele fosse uma sombra. Ela puxou rapidamente a mão.
Será que estava tendo alucinações?
Nico tinha despendido energia demais viajando nas sombras... talvez estivesse começando a desaparecer permanentemente. Se continuasse daquele jeito, forçando-se até os limites de sua força, por mais sete dias...
O ruído de um liquidificador de repente a despertou de seus pensamentos.
— Quer um coquetel de frutas? — perguntou o treinador. — Este é de abacaxi, morango, laranja e banana, tudo enterrado debaixo de uma montanha de coco ralado. Eu o batizei de Hércules!
— Eu... eu não quero, não, obrigada. — Ela percorreu com o olhar as sacadas que circundavam o pátio interno. Ainda estava achando muito estranho aquele restaurante totalmente vazio. Festa particular. HDVM. — Treinador, acho que vou checar o segundo andar. Não estou gostando do...
Seus olhos captaram um vislumbre de movimento. Na sacada à direita; uma forma escura. Acima da sacada, na beira do telhado, surgiram várias outras silhuetas contra o céu alaranjado.
Reyna sacou sua espada, mas era tarde demais.
Um brilho prateado, um zunido rápido e baixo, e a ponta de uma agulha se enterrou em seu pescoço. Sua visão se turvou. Seus braços e suas pernas ficaram moles. Ela desmoronou ao lado de Nico.
Antes de perder a consciência, Reyna viu os cães virem correndo em sua direção, mas eles congelaram no meio de um latido e tombaram.
Do bar, o treinador gritou:
— Ei!
Outro zunido rápido e baixo. Hedge foi derrubado com um dardo de prata no pescoço.
Reyna tentou dizer: Nico, acorde. Mas sua voz não saía. Seu corpo tinha sido desativado tão completamente quanto seus cães de metal.
Várias figuras escuras haviam surgido no telhado. Meia dúzia delas pulou para o pátio, em silêncio, com elegância.
Uma das figuras se debruçou sobre Reyna, que só distinguia um borrão cinza.
Uma voz abafada ordenou:
— Levem-na.
Um saco de pano cobriu sua cabeça. Reyna se perguntou vagamente se ia morrer daquele jeito, sem sequer lutar.
Mas logo isso já não lhe importava mais. Vários pares de mãos rudes a ergueram como se ela fosse um móvel grande demais, difícil de carregar, e ela mergulhou na inconsciência.

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