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O Sangue do Olimpo - CAP. XVIII

.. segunda-feira, 17 de novembro de 2014
Capítulo XVIII - Piper

PIPER NÃO QUERIA QUE UMA mesa de três pernas gritasse com ela.
Quando Jason visitou sua cabine naquela noite, ela tomou o cuidado de deixar a porta aberta, porque Buford, a Mesa Maravilhosa, levava muito a sério sua função de acompanhante adulto. Se tivesse a menor desconfiança de que havia um garoto e uma garota na mesma cabine sem supervisão, ele fumegava e vinha chacoalhando pelo corredor com a projeção holográfica do treinador Hedge berrando: “PARE COM ISSO! PAGUE VINTE FLEXÕES! VISTA ALGUMA COISA!”
Jason se sentou ao pé do beliche.
— Está quase no meu turno de vigia. Só quis ver como você estava antes.
Piper cutucou a perna dele com o pé.
— O cara que foi apunhalado quer saber como eu estou? Como você está se sentindo?
Ele deu um meio sorriso para ela. Seu rosto estava tão bronzeado pelo tempo passado na costa da África que a cicatriz em seu lábio parecia uma marca de giz. Os olhos azuis estavam ainda mais chamativos. O cabelo, branco como palha de milho, apesar de ele ainda ter uma falha onde havia sido atingido por uma bala da pistola do bandido Círon. Se um arranhão tão pequeno de bronze celestial demorava tanto para cicatrizar, Piper se perguntava como ele iria se recuperar do ferimento de ouro imperial na barriga.
— Já estive pior — disse Jason, tranquilizando-a. — Uma vez, no Oregon, uma dracaena cortou fora meus braços.
Piper se assustou. Depois deu um tapa de leve no braço dele.
— Mentiroso.
— Por um segundo eu peguei você.
Ficaram de mãos dadas em um silêncio confortável. Piper quase podia imaginar que eles eram adolescentes normais, aproveitando a companhia um do outro como um casal. Claro, Jason e ela ficaram alguns meses juntos no Acampamento Meio-Sangue, mas a guerra com Gaia sempre esteve pairando sobre eles. Como seria se não estivessem ocupados tentando não morrer doze vezes por dia?
— Eu nunca agradeci a você. — A expressão de Jason ficou séria. — Lá em Ítaca, depois que vi o que... restou de minha mãe, sua mania... quando fui ferido, você não deixou que eu desistisse, Pipes. Uma parte minha... — A voz dele vacilou. — Uma parte minha queria fechar os olhos e parar de lutar.
O coração de Piper se contraiu. Ela sentiu o próprio pulso nos dedos.
— Jason... você é um lutador. Você nunca desistiria. Quando encarou o espírito da sua mãe... naquele momento, você foi forte, não eu.
— Pode ser. — A voz dele estava seca. — Eu não queria botar um peso tão grande em cima de você, Pipes. É só que... eu tenho o DNA da minha mãe. Minha parte humana veio toda dela. E se eu fizer as escolhas erradas? E se eu cometer um erro irremediável quando estivermos lutando contra Gaia? Não quero acabar como minha mãe, reduzido a uma mania, remoendo meus arrependimentos para sempre.
Piper cobriu as mãos dele com as suas. Ela sentia como se estivesse de volta ao convés do Argo II, segurando a granada de gelo do boréada pouco antes de explodir.
— Você vai fazer as escolhas certas — disse ela. — Não sei o que vai acontecer com nenhum de nós, mas você nunca acabará como sua mãe.
— Como você pode ter tanta certeza?
Piper observou a tatuagem no antebraço dele: SPQR, a águia de Júpiter, doze linhas por seus anos na legião.
— Meu pai me contava uma história sobre fazer escolhas... — Ela balançou a cabeça. — Não, deixa pra lá. Estou parecendo o vovô Tom.
— Vá em frente — disse Jason. — Qual é a história?
— Bem... Havia dois caçadores Cherokee na floresta, certo? Cada um deles tinha um tabu.
— Um tabu... uma coisa que eles estavam proibidos de fazer.
— É.
Piper começou a relaxar. Devia ser por isso que seu pai e seu avô sempre gostaram de contar histórias. Era mais fácil falar até sobre o assunto mais aterrorizante quando ele estava sob a forma de algo que tinha acontecido com dois caçadores Cherokee séculos antes. Pegue um problema; transforme-o em entretenimento. Talvez por isso o pai dela tivesse virado ator.
— Um dos caçadores — continuou ela — não podia comer carne de veado. O outro não podia comer carne de esquilo.
— Por quê?
— Ei, eu não sei. Alguns tabus Cherokee eram proibições permanentes, como matar águias. — Ela deu um tapinha no símbolo do braço de Jason. — Isso era azar para praticamente todo mundo. Mas às vezes alguns Cherokee assumiam tabus temporários, talvez para purificar o espírito, ou talvez porque soubessem, por ouvir o mundo espiritual ou algo assim, que o tabu era importante. Eles seguiam seus instintos.
— Está bem — Jason parecia confuso. — Vamos voltar aos caçadores.
— Eles passaram o dia inteiro caçando, e a única coisa que pegaram foram esquilos. À noite, armaram acampamento, e o cara que podia comer carne de esquilo começou a prepará-la no fogo.
— Nham!
— Mais um motivo para eu ser vegetariana. Enfim, o segundo caçador, que não podia comer carne de esquilo, estava faminto. E só ficou lá sentado apertando a barriga enquanto o amigo comia. O primeiro caçador começou a se sentir culpado. “Ah, vá em frente”, disse ele. “Coma um pouco.” Mas o segundo caçador resistiu. “É meu tabu. Vou ter problemas sérios. Vou virar uma cobra ou coisa assim.” O primeiro riu. “De onde você tirou essa ideia maluca? Não vai acontecer nada. Você pode voltar a evitar carne de esquilo amanhã.” O segundo caçador sabia que não deveria, mas comeu.
Jason acariciou a mão dela, atrapalhando sua concentração.
— O que aconteceu?
— No meio da noite, o segundo caçador acordou gritando de dor. O primeiro correu até ele para ver qual era o problema. Ele puxou as cobertas do amigo e viu que as pernas dele tinham virado uma cauda de couro, e o corpo dele ia sendo coberto por pele de cobra. O pobre do caçador chorava, se desculpava com os espíritos e gritava de medo, mas não havia nada a fazer. O primeiro caçador ficou do seu lado e tentou confortá-lo, até que o coitado se transformou completamente em uma serpente gigante e foi embora rastejando. Fim.
— Adoro essas histórias Cherokee — disse Jason. — São tão pra cima.
— É, bem...
— Então o cara virou uma cobra. A moral é: Frank está comendo esquilos?
Ela riu, o que foi agradável.
— Não, seu bobo. A questão é: confie em seus instintos. Carne de esquilo pode ser boa para uma pessoa, mas tabu para outra. O segundo caçador sabia que tinha um espírito de serpente dentro dele, esperando para assumir o controle. Ele sabia que não deveria alimentar esse espírito ruim comendo carne de esquilo, mas fez isso assim mesmo.
— Então... eu não devo comer esquilos.
Piper ficou aliviada ao ver o brilho nos olhos dele. Ela pensou em algo que Hazel lhe contara em segredo algumas noites antes: Acho que Jason é a peça-chave de todo o plano de Hera. Ele foi sua primeira jogada; e será a última.
— O que quero que entenda — disse Piper, cutucando o peito dele — é que você, Jason Grace, conhece muito bem seus próprios espíritos ruins, e faz o possível para não alimentá-los. Você tem instintos sólidos e sabe segui-los. Por mais que tenha qualidades irritantes, é uma pessoa realmente boa que sempre tenta fazer a escolha certa. Então pare com essa conversa de desistir.
Jason franziu a testa.
— Espere aí. Eu tenho qualidades irritantes?
Ela revirou os olhos.
— Venha aqui.
Ela estava prestes a beijá-lo quando bateram na porta, e Leo surgiu na entrada da cabine.
— Uma festa? Estou convidado?
Jason limpou a garganta.
— Oi, Leo. O que está rolando?
— Ah, nada de mais. — Ele apontou para o convés. — Os venti insuportáveis de sempre tentando destruir o navio. Está pronto para o seu turno?
— Sim — Jason se inclinou e beijou Piper. — Obrigado. E não se preocupe. Estou bem.
— Isso — disse ela — era basicamente o que eu queria provar.
Depois que os garotos saíram, Piper deitou-se em seus travesseiros de plumas de pégaso e ficou contemplando as constelações que o abajur projetava no teto. Ela achava que não ia conseguir dormir, mas um dia inteiro lutando contra monstros no calor do verão cobrou seu preço. Em pouco tempo ela fechou os olhos e mergulhou em um pesadelo.

* * *

A Acrópole.
Piper nunca tinha estado lá, mas a reconheceu de fotos: uma fortaleza antiga localizada no alto de uma colina quase tão impressionante quanto a de Gibraltar. Elevava-se cerca de cento e vinte metros acima da Atenas moderna, com penhascos íngremes encimados por muralhas de calcário. No topo, templos em ruínas e guindastes modernos reluziam como prata ao luar.
Em seu sonho, Piper voava acima do Partenon, o antigo templo de Atena; o lado esquerdo de sua casca vazia estava cercado por andaimes de metal.
A Acrópole parecia deserta de mortais, talvez devido aos problemas financeiros da Grécia. Ou talvez as forças de Gaia tivessem arranjado um pretexto para manter os turistas e operários afastados.
A visão de Piper se concentrou no centro do templo. Havia tantos gigantes ali que parecia até uma festa para sequoias centenárias. Piper reconheceu alguns: aqueles gêmeos terríveis de Roma, Oto e Efialtes, vestidos com uniformes iguais de operário de construção; Polibotes, igual à descrição feita por Percy, com veneno escorrendo de seus dreadlocks e bocas abertas e famintas esculpidas no peitoral; o pior de todos, Encélado, o gigante que raptara o pai de Piper. Sua armadura era gravada com desenhos de chamas; e o cabelo, trançado com ossos humanos. Sua lança, do tamanho de um mastro de bandeira, queimava com labaredas roxas.
Piper tinha ouvido dizer que cada gigante nascera para se opor a um deus, mas havia muito mais do que doze gigantes reunidos ali no Partenon. Ela contou pelo menos vinte, e, como se isso não fosse intimidador o suficiente, uma horda de monstros menores se agitava ao redor dos gigantes: ciclopes, ogros, Nascidos da Terra de seis braços e dracaenae.
No centro da multidão havia um trono improvisado feito de andaimes retorcidos e blocos de pedra aparentemente arrancados aleatoriamente das ruínas.
Enquanto Piper observava, um novo gigante subiu os degraus na extremidade oposta da Acrópole. Ele vestia um enorme moletom esportivo de veludo, tinha correntes de ouro no pescoço e cabelo penteado para trás com gel, parecendo um membro de gangue de dez metros de altura – isso se os membros de gangue tivessem pés de dragão e pele laranja. O gigante mafioso correu na direção do Partenon, onde entrou aos tropeções, esmagando vários Nascidos da Terra sob seus pés. Ele parou sem fôlego ao pé do trono.
— Onde está Porfírion? — perguntou. — Trago notícias!
O velho inimigo de Piper, Encélado, deu um passo à frente.
— Atrasado como sempre, Hipólito. Espero que suas notícias justifiquem a espera. O rei Porfírion deve estar...
O chão entre eles se abriu. Um gigante ainda maior surgiu da terra, como uma baleia irrompendo do mar.
— O rei Porfírion está aqui — anunciou o próprio.
Ele parecia exatamente igual ao que Piper se lembrava da Casa dos Lobos, em Sonoma. Com doze metros de altura, era mais alto que seus irmãos. Na verdade – percebeu Piper, com preocupação – era do mesmo tamanho da Atena Partenos, que antigamente tinha habitado aquele templo. Em suas tranças da cor de algas marinhas brilhavam armas capturadas de semideuses. O rosto era cruel e verde-claro; os olhos, brancos como a névoa. Seu corpo parecia irradiar uma espécie de gravidade, fazendo os outros monstros se inclinarem na direção dele. Terra e seixos corriam pelo chão, acumulando-se ao redor de seus enormes pés de dragão.
O gigante mafioso, Hipólito, se ajoelhou.
— Meu rei, trago informações sobre o inimigo!
Porfírion sentou-se no trono.
— Fale.
— O navio dos semideuses está fazendo a volta no Peloponeso. Eles já destruíram os fantasmas em Ítaca e capturaram a deusa Nice em Olímpia.
A multidão de monstros se agitou, preocupada. Um ciclope roeu as unhas. Duas dracaenae trocaram moedas como se estivessem fazendo apostas em um bolão do Fim do Mundo.
Porfírion apenas riu.
— Hipólito, você quer matar seu inimigo Hermes e se tornar o mensageiro dos gigantes?
— Sim, meu rei!
— Então vai ter que trazer notícias mais frescas. Eu já sei de tudo isso. E nada disso importa! Os semideuses tomaram a rota que esperávamos que eles tomassem. Eles seriam tolos se seguissem por qualquer outro caminho.
— Mas, senhor, eles vão chegar a Esparta pela manhã! Se conseguirem libertar os makhai...
— Idiota! — A voz de Porfírion abalou as ruínas. — Nosso irmão, Mimas, espera por eles em Esparta. Você não precisa se preocupar. Os semideuses não podem mudar seu destino. De um jeito ou de outro, o sangue deles será derramado sobre estas pedras e despertará a Mãe Terra!
A multidão rugiu em aprovação e brandiu suas armas. Hipólito fez uma reverência e se afastou, mas outro gigante se aproximou do trono.
Piper notou, com certa surpresa, que aquele gigante era uma mulher. Não que fosse fácil perceber isso. A giganta tinha os mesmos pés de dragão e cabelo comprido trançado. Era tão alta e musculosa quanto os outros, mas seu peitoral com certeza era modelado para uma mulher. Também tinha a voz mais alta e aguda.
— Pai! — exclamou ela. — Vou perguntar de novo: por que aqui, neste lugar? Por que não nas encostas do próprio Monte Olimpo? Sem dúvida...
— Peribeia — interrompeu o rei, com gravidade. — A questão está decidida. O Monte Olimpo original agora é um pico estéril. Não nos oferecerá glória. Aqui, no centro do mundo grego, as raízes dos deuses são realmente profundas. Podem existir templos mais antigos, mas este Partenon é o que melhor guarda sua memória. Na mente dos mortais, este é o símbolo mais poderoso dos olimpianos. Quando o sangue dos últimos heróis for derramado aqui, a Acrópole será destruída. Este morro vai desmoronar, e toda a cidade vai ser consumida pela Mãe Terra. Nós seremos os mestres da criação!
A multidão gritou e aplaudiu, mas a giganta Peribeia não pareceu convencida.
— O senhor provoca o destino, pai — disse ela. — Os semideuses também têm aliados aqui. Não é sábio...
— SÁBIO? — Porfírion se levantou do trono. Todos os gigantes deram um passo para trás. — Encélado, meu conselheiro, explique à minha filha o que é sabedoria!
O gigante se aproximou. Seus olhos brilhavam como diamantes. Piper odiava aquele rosto. Ela o vira demais em seus sonhos quando o pai tinha sido feito prisioneiro.
— Não precisa se preocupar, princesa — garantiu Encélado. — Nós tomamos Delfos. Apolo foi expulso do Olimpo em vergonha. Os deuses não podem mais ver o futuro. Eles tropeçam às cegas. E sobre provocar o destino...
Encélado gesticulou para sua esquerda, e um gigante menor se aproximou arrastando os pés. Ele tinha cabelo grisalho e emaranhado, rosto enrugado e olhos leitosos de catarata. Em vez de armadura, usava uma túnica esfarrapada de aniagem. Suas pernas com escamas de dragão eram brancas como a geada.
Ele não parecia grande coisa, mas Piper percebeu que os outros monstros mantinham distância dele. Até Porfírion se inclinou para longe do velho.
— Este é Toas — disse Encélado. — Assim como vários de nós nascemos para matar certos deuses, Toas nasceu para se opor às Três Parcas. Ele vai estrangular as velhas com as próprias mãos. Vai arrebentar o fio delas e destruir seu tear. Ele vai destruir o próprio Destino!
O rei Porfírion se levantou e abriu os braços em triunfo.
— Basta de profecias, meus amigos! Basta de previsões! O tempo de Gaia será nossa era, vamos criar nosso próprio destino!
Ao ouvir isso, a multidão aplaudiu tão alto que Piper sentiu como se estivesse desmoronando.
Então percebeu que alguém a estava sacudindo para que acordasse.
— Ei — disse Annabeth. — Chegamos a Esparta. Quer se aprontar?
Piper sentou-se, ainda zonza. Seu coração batia forte.
— Claro... — Ela segurou o braço de Annabeth. — Mas, primeiro, você precisa escutar uma coisa.

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