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A Casa de Hades - CAP. XXVIII

.. sábado, 8 de março de 2014
Capítulo XXVIII - Hazel
— ATÉ QUE ENFIM! — EXCLAMOU CÍRON. — VOCÊS demoraram bem mais do que dois minutos!
— Desculpe — disse Jason. — Foi difícil decidir... qual dos pés.
Hazel tentou esvaziar a mente e imaginar a cena através dos olhos de Círon: o que ele desejava, o que esperava.
Essa era a chave para usar a Névoa. Não podia forçar alguém a ver o mundo como ela queria. Não conseguiria fazer a realidade de Círon parecer menos crível. Mas caso mostrasse o que ele queria ver... Bem, era filha de Plutão. Passara décadas com os mortos, ouvindo-os ansiar por vidas passadas das quais lembravam apenas vagamente, vidas distorcidas pela nostalgia.
Os mortos viam o que acreditavam que veriam. Assim como os vivos.
Plutão era o deus do Mundo Inferior, o deus da riqueza. Talvez essas duas esferas de influência estivessem mais relacionadas do que Hazel pensava. Não havia muita diferença entre anseio e ganância. Se era capaz de invocar ouro e diamantes, por que não poderia invocar outro tipo de tesouro – uma visão do mundo que as pessoas quisessem ver?
Claro, poderia estar errada. Neste caso, ela e Jason estavam prestes a virar comida de tartaruga.
Apoiou a mão no bolso do casaco, onde o graveto de Frank parecia mais pesado do que o habitual. Agora, não estava guardando apenas a vida dele e, sim, a de toda a tripulação.
Jason deu um passo à frente, com as mãos erguidas em sinal de rendição.
— Serei o primeiro, Círon. Lavarei o seu pé esquerdo.
— Excelente escolha! — Círon mexeu os dedos peludos e cadavéricos. — Acho que pisei em algo com esse pé. Estava um tanto melado dentro da bota. Mas sei que vai limpá-lo adequadamente.
As orelhas de Jason ficaram vermelhas. Pela tensão em seu pescoço, Hazel percebeu que o filho de Júpiter estava tentado a abandonar o plano e atacar Círon – um golpe rápido com a sua espada de ouro imperial. Mas Hazel sabia que ele falharia.
— Círon — interrompeu ela — você tem água? Sabão? Como vamos lavar...
— Com isto!
Círon rodou a pistola esquerda que, subitamente, transformou-se em um borrifador com um trapo. Ele jogou aquilo para Jason.
Jason leu o rótulo.
— Você quer que eu lave os seus pés com limpador de vidro?
— Claro que não! — Círon franziu a testa. — Aí diz limpador multissuperfície. Meus pés definitivamente podem ser definidos como uma multissuperfície. Além disso, é antibacteriano. Preciso disso. Acredite, água não funcionaria com estes bebês.
Círon mexeu os dedos de novo, exalando mais fedor de lanchonete de zumbis pelo penhasco.
Jason engasgou:
— Ah, deuses, não...
Círon deu de ombros.
— Você também pode escolher o que tenho na outra mão.
Ele ergueu a pistola esquerda.
— Ele vai lavar — disse Hazel.
Jason a encarou, mas Hazel ganhou a disputa de quem olhava mais feio.
— Tudo bem — murmurou ele.
— Excelente! Agora...
Círon foi até a pedra calcária mais próxima, que era do tamanho certo para servir de apoio para o pé. Ele olhou para o mar e pousou o pé sobre a pedra, de modo que mais parecia um explorador que acabara de descobrir um novo país.
— Observarei o horizonte enquanto você esfrega os meus joanetes. Será muito mais agradável.
— É — disse Jason. — Aposto que sim.
O garoto se ajoelhou diante do bandido, na borda do penhasco, onde era um alvo fácil. Um chute e ele cairia.
Hazel se concentrou. Imaginou ser Círon, o senhor dos bandidos. Estava olhando para um patético garoto de cabelos louros que não representava qualquer ameaça, era apenas mais um semideus derrotado prestes a se tornar sua vítima.
Em sua mente, visualizou o que aconteceria. Ela invocou a Névoa, chamando-a das profundezas da terra como fazia com ouro, prata ou rubis.
Jason esguichou o produto de limpeza. Seus olhos lacrimejaram. Ele limpou o dedão de Círon com o trapo e virou o rosto com ânsia de vômito. Hazel mal podia olhar. Quando o chute aconteceu, ela quase não o viu.
Círon acertou o peito de Jason, que foi lançado da beira do precipício, agitando os braços e gritando enquanto caía. Quando estava prestes a atingir a água, a tartaruga emergiu, engoliu-o em uma bocada e, em seguida, submergiu.
Alarmes soaram no Argo II. Os amigos de Hazel se espalharam pelo convés, preparando as catapultas. Hazel ouviu o grito de Piper.
Foi tão perturbador que ela quase perdeu a concentração. Forçou sua mente a se dividir em duas partes: uma completamente concentrada em sua tarefa enquanto a outra desempenhava o papel que Círon precisava ver.
Gritou, indignada.
— O que você fez?
— Ah, querida... — A voz de Círon parecia triste, mas Hazel tinha a impressão de que ele escondia um sorriso sob a bandana. — Foi um acidente, eu juro.
— Agora, meus amigos vão matar você!
— Eles podem tentar — disse Círon. — Mas, enquanto isso, acho que você vai ter tempo de lavar o meu outro pé! Acredite em mim, querida. Minha tartaruga está satisfeita agora. Ela não a quer. Você estará segura, a menos que recuse.
Ele apontou a pistola para a sua cabeça.
Hazel hesitou, deixando-o perceber sua angústia. Não poderia concordar com muita facilidade, ou Círon não pensaria que ela estava derrotada.
— Não me chute — implorou ela, quase chorando.
Os olhos de Círon brilharam. Era exatamente o que ele esperava. Ela estava derrotada e indefesa. Círon, filho de Poseidon, vencera outra vez.
Hazel mal podia acreditar que aquele cara tinha o mesmo pai que Percy Jackson. Então lembrou-se de que Poseidon tinha uma personalidade mutável, como o mar. Talvez seus filhos refletissem isso. Percy era filho do melhor lado de Poseidon – poderoso, embora gentil e útil, o tipo de mar que leva os navios com segurança para terras distantes. Círon era filho do outro lado de Poseidon, o tipo de mar que açoita incansavelmente o litoral até erodi-lo, que arrasta inocentes da praia e os afoga, ou que esmaga navios e mata tripulações inteiras sem misericórdia.
Ela pegou o borrifador que Jason deixara cair.
— Círon, seus pés são a coisa menos nojenta em você — resmungou ela.
Seus olhos verdes endureceram.
— Apenas limpe.
Ela se ajoelhou, tentando ignorar o fedor. Foi um pouco para o lado, forçando Círon a ajustar a sua postura, mas imaginou o mar ainda às suas costas. Manteve tal visão em mente enquanto ia de novo para o lado.
— Comece logo a lavar! — exigiu Círon.
Hazel reprimiu um sorriso. Havia conseguido fazê-lo girar cento e oitenta graus, mas ele continuava a ver o mar à sua frente e a paisagem rural às suas costas.
Ela começou a limpar.
Já fizera muito trabalho nojento anteriormente. Limpara os estábulos dos unicórnios no Acampamento Júpiter. Cavara e enterrara latrinas para a legião. Isso não é nada, disse consigo mesma. Mas era difícil não vomitar quando olhava para os dedos de Círon.
Quando o chute veio, ela foi jogada para trás, mas não foi muito longe. Caiu sentada na grama, a alguns metros dali.
Círon olhou para ela.
— Mas...
De repente, o mundo mudou. A ilusão se desfez, deixando o bandido totalmente confuso. O mar estava às suas costas. Apenas chutara Hazel para longe da borda.
Baixou a pistola.
— Como...
— Pare e entregue — disse Hazel.
Jason mergulhou do céu, bem acima da cabeça dela, e deu um encontrão no bandido, lançando-o do penhasco.
Círon gritou enquanto caía, disparando a pistola desesperadamente, mas, pela primeira vez, seus tiros não atingiram nada. Hazel se levantou. Chegou à borda do penhasco a tempo de ver a tartaruga surgir e abocanhar Círon em pleno ar.
Jason sorriu.
— Hazel, isso foi incrível. Sério... Hazel? Ei, Hazel?
Hazel caiu de joelhos, subitamente tonta.
Podia ouvir seus amigos comemorando no navio. Jason se aproximou dela, mas se movia em câmera lenta. Sua figura parecia borrada, e era impossível compreender o que dizia.
A geada cobriu as pedras e a grama à sua volta. O monte de tesouros que ela invocara voltou a afundar na terra. A Névoa rodopiou.
O que eu fiz?, pensou em pânico. Algo deu errado.
— Não, Hazel — disse uma voz grave às suas costas — você se saiu muito bem.
Ela mal se atrevia a respirar. Ouvira aquela voz uma única vez, mas a repetira em sua mente milhares de vezes.
Voltou-se e se viu diante de seu pai.
Ele estava vestido em estilo romano: cabelo escuro cortado bem curto, rosto pálido, anguloso e barbeado. Sua túnica e toga eram de lã preta, bordadas com fios de ouro. Rostos de almas atormentadas agitavam o tecido. A bainha de sua toga tinha uma linha da cor do carmim de um senador ou de um pretor, mas ondulava como um rio de sangue. No dedo anelar de Plutão havia uma enorme opala, como um pedaço polido de Névoa congelada. O seu anel de casamento, pensou a garota. Mas Plutão nunca se casara com a mãe de Hazel. Deuses não se casam com mortais. Aquele anel deveria ser de seu casamento com Perséfone.
O pensamento a deixou com tanta raiva que ela ignorou a tontura e se levantou.
— O que você quer? — perguntou.
Hazel esperava que seu tom de voz o ferisse, deixasse-o magoado depois de toda a dor que ele lhe causara. Mas um leve sorriso esboçou-se nos lábios de Plutão.
— Minha filha. Estou impressionado. Você ficou mais forte.
Não graças a você, Hazel teve vontade de dizer. Não queria sentir qualquer prazer com aquele elogio, mas ainda assim seus olhos arderam.
— Pensei que vocês, deuses maiores, estivessem incapacitados — conseguiu dizer — que as suas personalidades gregas e romanas estivessem lutando umas contra as outras.
— Estamos — concordou Plutão — mas você me invocou com tal força que me permitiu aparecer... mesmo que apenas por um instante.
— Não o invoquei.
Contudo, sabia que não era verdade. Pela primeira vez, Hazel aceitava de bom grado ser uma filha de Plutão. Havia tentado entender os poderes de seu pai e aproveitá-los ao máximo.
— Quando vier à minha casa, em Épiro, você deverá estar preparada — avisou Plutão — os mortos não vão recebê-la bem. E a feiticeira Pasifae...
— Pacífica? — perguntou Hazel.
Percebeu então que aquele devia ser o nome da mulher.
— Ela não se deixará enganar tão facilmente quanto Círon. — Os olhos de Plutão brilhavam como pedra vulcânica. — Você passou em seu primeiro teste, mas Pasifae pretende reconstruir o seu domínio, o que colocará todos os semideuses em risco. A menos que você a detenha na casa de Hades...
Sua forma bruxuleou. Por um instante, ficou barbudo, usando uma túnica grega e uma coroa de louros dourados na cabeça. A seus pés, mãos esqueléticas romperam a terra.
O deus rangeu os dentes e fez uma careta. Sua forma romana se estabilizou. As mãos esqueléticas voltaram a se dissolver na terra.
— Não temos muito tempo. — Seu pai parecia um homem sofrendo de uma terrível doença. — Saiba que as Portas da Morte estão no nível mais baixo do Necromanteion. Você deve fazer Pasifae ver o que ela deseja ver. Você está certa. Esse é o segredo de toda a magia. Mas não será fácil quando estiver no labirinto dela.
— Como assim? Que labirinto?
— Você vai entender — prometeu Plutão. — E, Hazel Levesque... sei que não acredita em mim, mas estou orgulhoso de sua força. Às vezes... Às vezes, a única maneira de cuidar de meus filhos é me mantendo afastado.
Hazel engoliu um insulto. Plutão era apenas mais um deus pai desnaturado dando desculpas esfarrapadas. Mas seu coração batia forte enquanto repetia mentalmente suas palavras: Estou orgulhoso de sua força.
— Vá encontrar os seus amigos — disse Plutão. — Eles vão ficar preocupados. A viagem até o Épiro ainda lhes reserva muitos perigos.
— Espere — disse Hazel.
Plutão ergueu uma sobrancelha.
— Quando conheci Tânatos, você sabe... a Morte... ele falou que eu não estava na lista de espíritos extraviados a serem capturados. Disse que talvez por isso você estivesse mantendo distância. Se me reconhecesse, teria que me levar de volta para o Mundo Inferior.
Plutão esperou.
— O que quer saber?
— Você está aqui. Por que não me leva para o Mundo Inferior, de volta para os mortos?
Plutão começou a desaparecer. Ele sorriu, mas Hazel não podia dizer se estava triste ou feliz.
— Talvez isso não seja o que eu queira ver, Hazel. Talvez eu nunca tenha estado aqui.

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