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A Casa de Hades - CAP. XVIII

.. sábado, 8 de março de 2014
Capítulo XVIII - Frank
FRANK TERIA GOSTADO DE VENEZA se não fosse verão, no meio da alta temporada, e se a cidade não estivesse tomada por enormes criaturas peludas. Espremidas entre as fileiras de casas antigas e os canais, as calçadas já eram estreitas demais para a multidão que se acotovelava e parava para tirar fotos. Os monstros deixavam tudo ainda pior. Vagavam de cabeça baixa, esbarrando nos mortais e farejando o chão.
Um pareceu ter encontrado algo de seu agrado à margem de um canal. Mordiscou e lambeu uma rachadura entre as pedras até conseguir remover uma espécie de raiz esverdeada. O monstro a consumiu alegremente e se afastou.
— Bem, eles são vegetarianos — disse Frank. — Essa é uma boa notícia.
Hazel segurou sua mão.
— A menos que complementem a sua dieta com semideuses. Tomara que não.
Frank ficou tão feliz por estar de mãos dadas com Hazel que as multidões, o calor e os monstros subitamente não lhe pareceram assim tão ruins. Sentia-se necessário. Útil.
Não que Hazel precisasse de sua proteção. Qualquer um que a tivesse visto montada em Arion, cavalgando em direção a um inimigo e brandindo a espada, saberia que ela podia cuidar de si mesma. Ainda assim, Frank gostava de estar ao seu lado, imaginando ser o seu guardacostas. Se qualquer um daqueles monstros tentasse feri-la, ele se transformaria em um rinoceronte com todo o prazer e o empurraria para dentro do canal.
Será que conseguiria se transformar em um rinoceronte? Frank nunca tentara.
Nico parou.
— Ali.
Entraram em uma rua menor, deixando o canal para trás. À frente deles havia uma pequena praça cercada por prédios de cinco andares. O lugar estava estranhamente deserto, como se os mortais sentissem que ali não era seguro. No meio do pátio com calçamento de seixos, umas doze vacas peludas farejavam um antigo poço de pedras cobertas de musgo.
— Um monte de vacas em um mesmo lugar — observou Frank.
— É, mas veja — disse Nico. — Atrás daquele arco.
Os olhos de Nico deviam ser melhores do que os dele. Frank forçou a vista. Na outra extremidade da praça, um arco de pedra entalhado com leões levava a uma rua estreita. Logo após o arco, uma das casas era preta; o único edifício dessa cor que Frank vira até então em Veneza.
— La Casa Nera? — arriscou ele.
Hazel segurou a mão de Frank com mais força.
— Eu não gosto desta praça. Está... fria.
Frank não tinha certeza do que Hazel queria dizer, já que ainda estava suando como um porco.
Mas Nico assentiu. Ele estudou as janelas da casa, a maioria fechada com venezianas de madeira.
— Tem razão, Hazel. Este lugar está cheio de lemures.
— Lêmures? — perguntou Frank, nervoso. — Suponho que você não esteja se referindo aos pequenos animais peludos de Madagascar.
— São fantasmas furiosos — esclareceu Nico. — Os lemures remontam ao tempo dos romanos. Eles perambulam por muitas das cidades italianas, mas nunca senti tantos em um mesmo lugar. Minha mãe dizia que... — Ele hesitou. — Ela me contava histórias sobre os fantasmas de Veneza.
Novamente, Frank ficou curioso sobre o passado de Nico, mas tinha medo de perguntar. Ele olhou para Hazel.
Ela parecia estar dizendo: Vá em frente. Nico precisa de mais prática em conversar com pessoas.
Os sons de rifles de assalto e bombas atômicas ficaram mais altos dentro da cabeça de Frank. Marte e Ares estavam tentando superar um ao outro com Dixie e O Hino de Batalha da República. Frank fez o possível para ignorá-los.
— Nico, sua mãe era italiana? — perguntou. — Era de Veneza?
Nico assentiu, relutante.
— Ela conheceu Hades aqui, na década de 1930. Com a Segunda Guerra Mundial prestes a estourar, fugiu para os EUA comigo e com minha irmã. Quer dizer... Bianca, minha outra irmã. Não me lembro muito da Itália, mas ainda sei falar o idioma.
Frank tentou pensar em uma resposta. Puxa, que legal não parecia apropriado. Ele estava perto não de um, mas de dois semideuses tirados de seu tempo. Tecnicamente, ambos eram uns setenta anos mais velhos do que ele.
— Deve ter sido difícil para a sua mãe — disse Frank. — Acho que fazemos qualquer coisa pelas pessoas que amamos.
Hazel apertou sua mão de modo aprovador. Nico olhou para os seixos do calçamento.
— É — disse com amargura. — Acho que fazemos.
Frank não sabia o que Nico estava pensando. Tinha dificuldade em imaginar Nico di Angelo fazendo algo por amor, exceto, talvez, por Hazel. Mas decidiu que já fizera muitas perguntas pessoais.
— Então, os lemures... — Ele engoliu em seco. — Como podemos evitá-los?
— Já estou cuidando disso — respondeu Nico. — Enviei uma mensagem dizendo que devem ficar longe e nos ignorar. Esperemos que seja o bastante. Caso contrário... as coisas podem ficar complicadas.
Hazel não parecia convencida.
— Vamos em frente — sugeriu ela.
Quando estavam no meio da praça, tudo deu errado. Mas não foi por causa dos fantasmas. Eles contornavam o poço no centro da praça, tentando manter certa distância dos monstros bovinos, quando Hazel tropeçou em um pedaço solto de calçamento. Frank a segurou. Seis ou sete daquelas enormes criaturas cinzentas voltaram-se para eles. Frank vislumbrou um olho verde brilhante sob uma juba e imediatamente foi tomado por uma onda de náusea, como a que sentia quando comia muito queijo ou sorvete.
As criaturas emitiram profundos sons guturais, como sirenes furiosas.
— Vacas boazinhas — murmurou Frank, tranquilizador. Ele se colocou entre seus amigos e os monstros. — Pessoal, acho que devemos sair daqui bem devagar.
— Eu sou uma estabanada — murmurou Hazel. — Me desculpem.
— Não é culpa sua — disse Nico. — Olhe para os seus pés.
Frank olhou para baixo e ofegou, surpreso.
Sob seus pés, as pedras do calçamento se moviam: gavinhas pontiagudas surgiam das rachaduras.
Nico recuou um passo. As raízes serpentearam em sua direção, tentando segui-lo. As gavinhas ficaram mais grossas, exalando um vapor verde que cheirava a repolho cozido.
— Essas raízes parecem gostar de semideuses — observou Frank.
A mão de Hazel segurou o punho da espada.
— E as vacas gostam das raízes.
Todo o rebanho olhava agora em sua direção, emitindo rosnados repetidos que lembravam sirenes e batendo os cascos no chão. Frank sabia o suficiente sobre comportamento animal para entender a mensagem: vocês estão pisando em nossa comida. Isso os torna nossos inimigos.
Frank tentou raciocinar. Havia monstros demais, não tinham como enfrentá-los. E algo nos olhos das criaturas, escondidos sob as jubas peludas... Frank ficara nauseado apenas com um olhar de relance. Tinha o mau pressentimento de que, caso aqueles monstros fizessem contato visual, pudessem deixá-lo muito mais do que nauseado.
— Não olhem para os olhos deles — advertiu — vou distraí-los. Vocês dois recuem bem devagar em direção à casa negra.
As criaturas se prepararam para atacar.
— Esqueçam o que eu disse — disse Frank. — Corram!

* * *

No fim das contas, Frank descobriu que não conseguia se transformar em rinoceronte e perdeu um tempo precioso tentando.
Nico e Hazel correram para a rua lateral. Frank se posicionou na frente dos monstros, na esperança de chamar a sua atenção. Ele berrou o mais alto que pôde, imaginando a si mesmo como um temível rinoceronte, mas com Ares e Marte gritando dentro de sua cabeça, não conseguia se concentrar. Continuou o Frank de sempre.
Dois dos monstros bovinos se destacaram do rebanho para perseguir Nico e Hazel.
— Não! — gritou Frank para as criaturas. — Aqui! Eu sou um rinoceronte!
O restante da manada o cercou. Os animais rosnavam, e um gás verde-esmeralda saía de suas narinas. O semideus recuou um passo para evitar o vapor, mas o fedor quase o fez desmaiar.
Muito bem, nada de rinoceronte. Outra coisa. Frank sabia que tinha apenas alguns segundos antes que os monstros o pisoteassem ou o envenenassem, mas não conseguia raciocinar. Não conseguia se concentrar na imagem de animal nenhum tempo o bastante para se transformar.
Então, olhou para uma das varandas das casas e viu uma escultura em pedra, o símbolo de Veneza.
No instante seguinte, Frank era um leão adulto. Soltou um rugido desafiador, então pulou para longe dos monstros que o cercavam e aterrissou a oito metros dali, em cima do antigo poço de pedra.
Os monstros rosnaram em resposta. Três deles fizeram sua investida ao mesmo tempo, mas Frank estava preparado. Seus reflexos de leão eram feitos para o combate ágil. Ele transformou os dois primeiros monstros em pó com suas garras, afundou as presas na garganta do terceiro e jogou-o para o lado.
Restavam sete, e mais os dois que perseguiam os seus amigos. As chances não eram boas, mas Frank precisava manter o rebanho concentrado nele. Rugiu para os monstros, que se afastaram.
Sim, eles estavam em vantagem numérica. Mas Frank era um predador top de linha. Os monstros do rebanho sabiam disso. Tinham acabado de assisti-lo mandar três de seus amigos para o Tártaro.
Ele se aproveitou da vantagem e saltou do poço, ainda mostrando as presas. O rebanho recuou.
Se pudesse simplesmente contornar o grupo correndo e ir atrás de seus amigos... Frank estava se saindo bem, até recuar um passo em direção ao arco. Uma das vacas, a mais corajosa ou mais estúpida, interpretou aquilo como um sinal de fraqueza. Ela avançou e soprou gás verde no rosto de Frank.
Ele transformou o monstro em pó com suas garras, mas o estrago já estava feito. Frank prendeu a respiração. Ainda assim, sentia os pelos do focinho queimando. Seus olhos ardiam. Cambaleou para trás, meio cego e tonto, vagamente consciente de Nico gritando o seu nome.
— Frank! Frank!
Ele tentou se concentrar. Estava de volta à forma humana, com ânsia de vômito e cambaleante. A pele do rosto parecia estar descascando. A nuvem de gás verde flutuava entre ele e o rebanho à sua frente. Os monstros bovinos restantes olhavam-no desconfiados, talvez se perguntando se Frank tinha algum outro truque na manga.
Ele olhou para trás. Sob o arco de pedra, Nico di Angelo empunhava a espada negra de ferro estígio, acenando para que Frank se apressasse. Aos pés de Nico, duas poças escuras manchavam a calçada – sem dúvida restos dos monstros bovinos que os perseguiram.
E Hazel... estava encostada na parede atrás do irmão. Ela não se movia.
Frank correu em sua direção, esquecendo-se do rebanho de monstros. Passou correndo por Nico e agarrou os ombros da garota. A cabeça de Hazel tombou na direção do peito.
— Ela levou uma baforada de gás verde no rosto — contou Nico, arrasado. — Eu... eu não fui rápido o bastante.
Frank não sabia dizer se ela estava respirando. Raiva e desespero lutavam dentro dele. Sempre tivera medo de Nico. Agora, queria dar uma voadora no filho de Hades e jogá-lo no canal mais próximo. Talvez não fosse justo, mas Frank não se importava. Tampouco os deuses da guerra que gritavam em sua cabeça.
— Precisamos levá-la de volta para o navio — disse Frank.
O rebanho de monstros bovinos rondava cautelosamente, um pouco além do arco, lançando os seus berros de sirene. Nas ruas em torno, outros monstros respondiam. Reforços. Logo os semideuses estariam cercados.
— Nunca conseguiremos voltar a pé — disse Nico. — Frank, transforme-se em uma águia gigante. Não se preocupe comigo. Leve-a de volta ao Argo II!
Com o rosto ardendo e as vozes gritando em sua mente, Frank não sabia se conseguiria mudar de forma, mas estava prestes a tentar quando uma voz atrás deles disse:
— Seus amigos não podem ajudá-los. Eles não conhecem a cura.
Frank se virou na direção da voz. À entrada da casa negra havia um homem jovem vestindo calça e camisa jeans. Tinha cabelos pretos encaracolados e um sorriso amigável, embora Frank duvidasse que ele fosse um amigo. Provavelmente nem era humano.
Naquele momento, Frank não se importava nem um pouco.
— Você pode curá-la?
— É claro — disse o homem. — Mas é melhor entrarem logo. Acho que vocês irritaram todos os catóblepas de Veneza.

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