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A Casa de Hades - CAP. VII

.. quinta-feira, 6 de março de 2014
Capítulo VII - Annabeth
QUANDO CHEGARAM À BEIRADA DO penhasco, Annabeth tinha certeza de que os estava levando para a morte.
O precipício tinha mais de trinta metros de altura. No fundo havia uma versão pesadelo do Grand Canyon: um rio de fogo passando por fendas obsidianas irregulares. A corrente vermelha brilhante projetava sombras terríveis nas faces rochosas do penhasco.
Mesmo do alto do cânion, o calor era intenso. O frio do Rio Cócito não tinha saído dos ossos de Annabeth, mas agora sentia o rosto ardido parecendo queimado de sol. Respirar era cada vez mais difícil, como se seu peito estivesse cheio de bolinhas de isopor. Os cortes na mão sangravam mais em vez de menos. O pé de Annabeth, que estava praticamente curado, parecia piorar de novo. Ela havia tirado a tala improvisada, mas agora estava arrependida. Seu rosto se contorcia de dor a cada passo.
Supondo que conseguissem chegar ao rio de chamas, o que ela duvidava, seu plano parecia uma insanidade absoluta.
— Hã... — Percy examinou o penhasco.
Ele apontou para uma pequena fissura que descia em diagonal da beirada até o fundo.
— A gente podia tentar aquela saliência. Talvez dê para descer por ali.
Ele não disse que seria loucura tentar. Conseguiu parecer esperançoso. Annabeth ficou feliz por isso, mas continuava preocupada por talvez estar conduzindo-o para a morte.
Claro que se ficassem ali iam morrer de qualquer jeito. O ar quente do Tártaro estava deixando seus braços cobertos de bolhas. Aquele ambiente era quase tão saudável quanto a área de uma explosão nuclear.
Percy foi na frente. A saliência mal era larga o bastante para eles apoiarem as pontas dos pés. Suas mãos procuraram qualquer rachadura na rocha vítrea. Toda vez que Annabeth se apoiava no pé machucado, tinha vontade de gritar de dor. Tinha arrancado as mangas da camiseta e usado o tecido para envolver as palmas das mãos sangrentas, mas seus dedos ainda estavam fracos e escorregadios.
Alguns passos abaixo dela, Percy resmungou enquanto procurava outro apoio para a mão.
— Então... como se chama mesmo esse rio?
— Flegetonte — disse ela. — Você devia se concentrar em descer.
— Flegetonte?
Ele seguia caminhando pela saliência estreita e se segurava onde podia.
Tinham percorrido um terço do caminho até o fundo do penhasco, mas, da altura em que estavam, ainda morreriam se caíssem.
— Parece até nome de bicho pré-histórico: flegetonte, mastodonte...
— Por favor, não me faça rir — disse ela.
— Só estou tentando aliviar o clima.
— Obrigada — grunhiu Annabeth, quase pisando fora da saliência com o pé machucado. — Vou despencar para a morte com um sorriso no rosto.
Eles seguiram em frente, um passo de cada vez. Os olhos de Annabeth ardiam com o suor. Seus braços tremiam. Mas, para sua surpresa, finalmente chegaram ao fim do penhasco.
Quando chegou ao fundo, tropeçou. Percy a segurou. Annabeth ficou assustada ao sentir que a pele dele fervia. Bolhas vermelhas haviam irrompido em seu rosto, fazendo-o parecer uma vítima de varíola.
Sua própria visão estava embaçada. Sentia como se a garganta estivesse cheia de bolhas, e seu estômago estava mais apertado que um punho cerrado.
Temos de nos apressar, pensou.
— Só até o rio — disse a Percy, tentando não parecer em pânico. — Vamos conseguir.
Caminharam com dificuldade por saliências escorregadias de vidro, contornando enormes blocos de rocha e evitando estalagmites que os teriam empalado ao menor escorregão. Suas roupas esfarrapadas soltavam vapor devido ao calor do rio, mas eles seguiram em frente até caírem de joelhos às margens do Flegetonte.
— Temos de beber — disse Annabeth.
Percy hesitou com os olhos semicerrados. Ele contou até três antes de responder.
— Er... beber fogo?
— O Flegetonte corre do reino de Hades para o Tártaro. — Annabeth mal conseguia falar. Sua garganta estava se fechando por conta do calor e do ar ácido. — O rio é usado para punir os maus. Mas além disso... algumas lendas o chamam de Rio da Cura.
— Algumas lendas?
Annabeth engoliu em seco, tentando não desmaiar.
— O Flegetonte preserva os maus para que eles tenham que suportar os tormentos dos Campos de Punição. Eu acho que... pode ser o equivalente do Mundo Inferior da ambrosia e do néctar.
O rosto de Percy se contorceu quando cinzas se ergueram do rio e giraram perto dele.
— Mas isso é fogo. Como vamos...
— Assim. — Annabeth enfiou as mãos no rio.
Burrice? Sim, mas ela estava convencida de que não tinham escolha. Se esperassem um pouco mais, iriam desmaiar e morrer. Era melhor tentar algo idiota e torcer para funcionar.
Ao primeiro contato, o fogo não era doloroso. Ele parecia frio, o que provavelmente significava que era tão quente que estava sobrecarregando os nervos de Annabeth. Antes que pudesse mudar de ideia, pegou um pouco do líquido flamejante nas mãos em concha e o levou à boca.Esperava que tivesse um gosto parecido com o de gasolina. Mas era muito pior.
Certa vez, em um restaurante lá em São Francisco, ela tinha cometido o erro de provar a pimenta mais picante do mundo, que vinha com um prato de comida indiana. Após mordiscá-la, achou que seu sistema respiratório fosse implodir. Beber do Flegetonte era como virar um copo do suco concentrado daquela pimenta. Suas cavidades nasais se encheram de chamas líquidas. A boca parecia estar sendo frita. Os olhos derramaram lágrimas ferventes, e todos os poros de seu rosto pipocaram. Ela desmoronou, engasgando e vomitando enquanto o corpo inteiro tremia violentamente.
— Annabeth! — Percy agarrou seus braços, impedindo-a por pouco de rolar para dentro do rio.
O acesso passou. Ela respirou fundo com dificuldade e conseguiu se sentar. Sentia-se horrivelmente fraca e enjoada, mas a respiração seguinte foi mais fácil. As bolhas nos braços começaram a sumir.
— Funcionou — disse com voz rouca. — Percy, você precisa beber.
— Eu... — Ele revirou os olhos e caiu sobre ela.
Desesperada, Annabeth encheu outra vez as palmas em concha. Ignorando a dor, pingou o fogo líquido na boca de Percy. Ele não reagiu.
Tentou de novo, derramando as mãos cheias em sua garganta. Dessa vez, ele engasgou e tossiu. Annabeth o segurou enquanto Percy tremia e o fogo mágico agia em seu corpo. A febre passou. As bolhas sumiram. Ele conseguiu sentar e estalar os lábios.
— Ergh — disse ele. — Apimentado, mas nojento.
Annabeth riu sem forças. Estava tão aliviada... ficou até meio tonta.
— É. Isso mais ou menos resume tudo.
— Você nos salvou.
— Por enquanto. O problema é que ainda estamos no Tártaro.
Percy piscou. Olhou ao redor como se começasse a aceitar que estavam ali.
— Por Hera! Nunca pensei... bem, não tenho certeza do que pensei. Talvez que o Tártaro fosse um espaço vazio, um poço sem fundo. Mas este é um lugar real.
Annabeth lembrou da paisagem que vira enquanto caíam: uma série de platôs que iam descendo até sumir na escuridão.
— Nós ainda não vimos tudo — alertou ela. — Isto pode ser só uma parte mínima do abismo, os degraus da entrada.
— O tapete de boas-vindas — murmurou Percy.
Os dois olharam para as nuvens cor de sangue que pairavam na névoa cinzenta. Não tinham forças para subir aquele penhasco de volta de jeito nenhum, mesmo que quisessem. Agora só havia duas opções: subir ou descer o Flegetonte, acompanhando suas margens.
— Vamos achar uma saída — disse Percy. — As Portas da Morte.
Annabeth estremeceu. Ela se lembrava do que Percy dissera pouco antes de caírem no Tártaro. Tinha feito Nico di Angelo prometer levar o Argo II até Épiro, até o lado mortal das Portas da Morte.
Encontramos vocês lá, dissera Percy.
A ideia parecia ainda mais louca do que beber fogo. Como eles poderiam sair andando pelo Tártaro e encontrar as Portas da Morte? Mal tinham conseguido cambalear por cem metros naquele lugar venenoso sem morrer.
— Temos que conseguir — disse Percy. — Não apenas por nós, mas por todos os que amamos. As Portas têm que ser fechadas pelos dois lados, ou os monstros vão continuar a passar. As forças de Gaia acabarão dominando o mundo.
Annabeth sabia que ele tinha razão. Mesmo assim... era impossível pensar em um plano com alguma chance de sucesso. Eles não tinham como localizar as Portas. Não sabiam quanto tempo iam demorar, sequer se o tempo passava na mesma velocidade no Tártaro. Como poderiam sincronizar um encontro com seus amigos? E Nico dissera que a legião dos monstros mais fortes de Gaia vigiava as Portas do lado do Tártaro. Annabeth e Percy não podiam exatamente fazer um ataque direto.
Ela resolveu não mencionar nada disso. Os dois sabiam que não tinham muita chance. Além do mais, após nadarem no Rio Cócito, Annabeth tinha ouvido lamentos e gemidos o bastante para uma vida. Prometeu a si mesma nunca mais voltar a reclamar.
— Bem. — Ela respirou fundo, grata por seus pulmões finalmente terem parado de arder. — Se ficarmos perto do rio, vamos sempre ter um modo de nos curarmos. Se descermos o rio...
Aconteceu tão rápido que Annabeth teria morrido se estivesse sozinha.
Os olhos de Percy se fixaram em algo atrás dela. Annabeth girou quando uma forma escura enorme se lançou em sua direção, uma massa monstruosa com pernas finas cobertas de espinhos, olhos reluzentes e presas à mostra.
Só teve tempo de pensar: Aracne. Mas estava paralisada de medo, sem conseguir raciocinar por causa do cheiro doce enjoativo.
Então ouviu o SHWINK da caneta esferográfica de Percy se transformando em espada. A lâmina de bronze reluzente descreveu um arco acima da cabeça de Annabeth. Um gemido horrível ecoou pelo cânion.
Ela ficou ali parada, atônita, enquanto a poeira amarela, os restos de Aracne, caía ao seu redor como uma chuva de pólen de árvore.
— Você está bem?
Percy examinou os penhascos e blocos rochosos, à procura de outros monstros, mas nada mais apareceu. A poeira dourada da aranha caiu sobre as rochas obsidianas. Annabeth olhou impressionada para o namorado. A lâmina de bronze celestial de Contracorrente brilhava ainda mais forte na escuridão do Tártaro e emitiu um silvo desafiador ao cortar o ar denso e quente, como uma serpente furiosa.
— Ela... ela teria me matado — gaguejou Annabeth.
Percy chutou a terra sobre as rochas com a cara amarrada e um ar nada satisfeito.
— A morte dela foi muito rápida, considerando como torturou você. Ela merecia pior.
Annabeth não podia negar isso, mas o tom duro de Percy a incomodou. Ela nunca vira alguém ficar tão raivoso ou vingativo por causa dela. Ficou quase feliz por Aracne ter morrido tão rápido.
— Como você reagiu tão depressa?
Percy deu de ombros.
— Temos que cuidar um do outro, não é? Agora, você estava dizendo... rio abaixo?
Annabeth assentiu com a cabeça, ainda confusa. A poeira amarela se dissipou sobre a margem rochosa e virou vapor. Pelo menos agora sabiam que era possível matar monstros no Tártaro... apesar de ela não ter ideia de por quanto tempo Aracne permaneceria morta.
Annabeth não planejava ficar ali o bastante para descobrir.
— É, rio abaixo — conseguiu dizer. — Se o Flegetonte vem dos níveis superiores do Mundo Inferior, deve correr para as profundezas do Tártaro...
— Na direção mais perigosa — completou Percy. — Que é provavelmente onde ficam as Portas. Sorte a nossa.

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