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A Casa de Hades - CAP. LXV

.. sábado, 15 de março de 2014
Capítulo LXV - Frank

FRANK ESPERAVA FOGOS DE ARTIFÍCIO.
Ou ao menos um grande cartaz dizendo: BEM-VINDO AO LAR!
Três mil anos antes, seu ancestral grego – o bom e velho Poriclimeno, o metamorfo – navegara para o leste com os Argonautas. Séculos mais tarde, os descendentes de Poriclimeno serviram nas legiões romanas orientais. Então, devido a uma série de desventuras, a família acabou na China, finalmente emigrando para o Canadá no século XX. Agora, Frank estava de volta à Grécia, o que significava que a família Zhang fizera a volta ao mundo.
Parecia ser motivo de comemoração, embora o único comitê de boas-vindas fosse um bando de harpias selvagens e famintas que atacaram o navio. Frank se sentiu mal ao abatê-las com seu arco. Não parava de pensar em Ella, a amiga harpia assustadoramente inteligente de Portland. Mas aquelas harpias não eram Ella e alegremente teriam arrancado seu rosto. Assim, ele as reduziu a nuvens de poeira e penas.
A paisagem grega abaixo era tão inóspita quanto as harpias. As colinas eram cobertas de pedras e cedros atrofiados que tremulavam no ar nebuloso. O sol ardia como se estivesse tentando transformar o campo em um escudo de bronze celestial. Mesmo a trinta metros de altura, podia ouvir as cigarras zumbindo nas árvores, um barulho sonolento e sobrenatural que fazia seus olhos pesarem. Até mesmo as vozes do deus da guerra dentro de sua cabeça pareciam ter cochilado. Mal incomodaram Frank desde que a tripulação chegara à Grécia.
O suor escorria pelo seu pescoço. Após ter sido congelado no convés inferior pela louca deusa da neve, Frank pensou que nunca voltaria a se aquecer outra vez, mas agora as costas de sua camisa estavam encharcadas.
— Quente e úmido! — Leo sorriu ao leme. — Isso me dá saudades de Houston! O que me diz, Hazel? Tudo o que precisamos agora são alguns mosquitos gigantes e sentiremos como se estivéssemos na Costa do Golfo!
— Muito obrigada, Leo — resmungou Hazel — provavelmente agora seremos atacados por mosquitos monstros da Grécia Antiga.
Frank os observou, admirando silenciosamente como a tensão entre os dois desaparecera.
Não sabia o que tinha acontecido com Leo durante seus cinco dias de exílio, mas aquilo o mudara. Ainda fazia brincadeiras, mas Frank sentia que o filho de Hefesto estava diferente, como um navio com uma nova quilha. Talvez não pudesse ver a quilha, mas sabia que estava lá pela maneira como o barco fendia as ondas.
Leo não parecia tão focado em provocá-lo. Conversava com mais facilidade com Hazel, sem os olhares melancólicos e vagos que tanto incomodavam Frank.
A garota indicara o problema em uma conversa entre os dois:
“Ele está apaixonado por alguém.”
Frank estava incrédulo.
“Como? Onde? Como você pode saber?”
Hazel sorrira.
“Apenas sei.”
Como se fosse uma filha de Vênus em vez de Plutão. Frank não entendeu.
É claro que ficou aliviado por Leo não estar dando em cima de sua namorada, mas Frank também estava um tanto preocupado com ele. Claro, tinham as suas diferenças, mas depois de tudo o que passaram juntos, não queria ver Leo ter seu coração partido.
— Ali!
A voz de Nico tirou Frank de seu devaneio. Como sempre, di Angelo estava empoleirado no topo do mastro. Apontou para um rio verde e brilhante que serpenteava pelas colinas a um quilômetro de distância.
— Leve-nos até lá. Estamos perto do templo. Muito perto.
Como que para confirmar sua informação, um raio negro atravessou o céu, deixando manchas escuras diante dos olhos de Frank e eriçando os pelos de seus braços.
Jason atou o cinto da espada.
— Pessoal, peguem suas armas. Leo, leve-nos para perto, mas não aterrisse. Nenhum contato com o solo além do necessário. Piper e Hazel, peguem os cabos de ancoragem.
— Agora mesmo! — exclamou Piper.
Hazel deu um beijinho na bochecha de Frank e correu para ajudar.
— Frank — disse Jason — vá lá embaixo e chame o treinador Hedge.
— Ok!
Ele desceu as escadas e dirigiu-se à cabine de Hedge. Ao se aproximar da porta, diminuiu os passos. Não queria surpreender o sátiro com barulho. O treinador Hedge tinha o hábito de pular no corredor sacudindo seu taco de beisebol se achasse que havia invasores a bordo. Frank quase teve a cabeça arrancada algumas vezes a caminho do banheiro.
Ergueu a mão para bater. Então, percebeu que a porta estava entreaberta. Ouviu o treinador Hedge falando lá dentro.
— Vamos lá, meu bem! — disse o sátiro. — Sabe que não é assim!
Frank congelou. Não queria bisbilhotar, mas não sabia o que fazer. Hazel mencionara estar preocupada com o treinador. Insistia em dizer que algo o estava incomodando, mas Frank não tinha pensado muito naquilo até então.
Nunca ouvira o treinador falar com tanta delicadeza. Normalmente, os únicos sons que Frank ouvia sair da cabine do treinador eram de eventos esportivos na tevê, ou o treinador gritando: “É! Pegue todos eles!” enquanto assistia a seus filmes favoritos de artes marciais. Frank tinha certeza de que o treinador não estaria chamando Chuck Norris de meu bem.
Ouviu-se outra voz. Feminina, embora quase inaudível, como se viesse de muito longe.
— Eu vou — prometeu o treinador Hedge — mas, hã, estamos a caminho de uma batalha — pigarreou — e pode ser feia. Apenas fique em segurança. Eu voltarei. Prometo.
Frank não conseguiu aguentar mais. Bateu com força.
— Ei, treinador?
A conversa parou.
Frank contou até seis. A porta foi aberta com violência.
O treinador Hedge olhou feio para ele, com olhos injetados de sangue, como se estivesse vendo muita tevê. Usava o boné de beisebol de costume e um short de ginástica, com uma armadura de couro sobre a camisa e o apito pendurado ao pescoço, talvez para marcar uma falta contra os exércitos de monstros.
— Zhang. O que você quer?
— Hã... estamos nos preparando para a batalha. Precisamos de você no convés.
O cavanhaque do treinador estremeceu.
— É. Claro que precisam.
Parecia estranhamente indiferente diante da possibilidade de uma batalha.
— Não queria... quer dizer, ouvi você falando — gaguejou Frank. — Você estava enviando uma mensagem de Íris?
Hedge parecia a ponto de dar um tapa na cara dele, ou ao menos soprar o apito bem alto. Então, seus ombros tombaram. Suspirou e voltou para dentro da cabine, deixando Frank em pé e sem saber o que fazer.
O treinador sentou em seu beliche, apoiou o queixo na mão em concha e examinou a cabine com um olhar melancólico. O lugar parecia um dormitório de faculdade depois de um furacão, o chão coberto de roupas (talvez para usar, talvez para comer. Era difícil saber quando o assunto eram sátiros), DVDs e pratos sujos espalhados sobre a cômoda em volta da tevê. Toda vez que o navio balançava, uma variedade de equipamentos esportivos rolava pelo chão: bolas de futebol, de basquete, de beisebol e, por algum motivo, uma única bola de bilhar. Tufos de pelo de bode flutuavam pelo ar e se acumulavam embolados sob os móveis. Se juntasse todos os tufos, dava para fazer outro treinador Hedge.
Na mesa de cabeceira dele, havia uma tigela de água, uma pilha de dracmas de ouro, uma lanterna e um prisma de vidro para produzir arco-íris. Obviamente, Hedge viera preparado para enviar um monte de mensagens de Íris.
Frank lembrou que Piper lhe contara sobre a namorada ninfa do vento do treinador, que trabalhara para o pai de Piper. Qual era mesmo o nome dela...? Melinda? Mili...? Não, Mellie.
— Hum, Mellie, sua namorada, está bem? — arriscou Frank.
— Não é da sua conta! — rebateu o treinador.
— Certo.
Hedge revirou os olhos.
— Tudo bem! Se quer saber, sim, estava conversando com Mellie. Mas ela não é mais a minha namorada.
— Ah — Frank sentiu um peso no coração — vocês se separaram?
— Não, seu idiota! Nós nos casamos! Ela é minha esposa!
Frank teria ficado menos surpreso se o treinador tivesse lhe dado um tapa.
— Treinador, isso... isso é ótimo! Quando... como?
— Não é da sua conta! — gritou outra vez.
— Hum... tudo bem.
— Fim de maio — disse o treinador — pouco antes da partida do Argo II. Não queríamos chamar muita atenção.
Frank sentiu como se o navio estivesse inclinando novamente, mas devia ser apenas impressão sua. O equipamento esportivo continuava acumulado contra a parede oposta.
O treinador estivera casado todo aquele tempo? Apesar de recém-casado, concordara em vir naquela missão. Não admira que Hedge tenha ligado tantas vezes para casa. Não era à toa que estava tão mal-humorado e agressivo.
Ainda assim... Frank sentia que algo mais estava acontecendo. O tom de voz do treinador durante a mensagem de Íris dava a entender que estavam discutindo um problema.
— Não queria me meter — disse Frank — mas... ela está bem?
— Era uma conversa particular!
— É. Você está certo.
— Tudo bem! Vou lhe dizer.
Hedge arrancou um pouco de pelo de sua coxa e deixou-o flutuar no ar.
— Ela tirou licença de seu trabalho em Los Angeles e foi passar o verão no Acampamento Meio-Sangue porque achamos que... — Sua voz falhou. — Achamos que seria mais seguro. Agora ela está presa lá, com os romanos prestes a atacar. Ela está... está muito assustada.
Frank se deu conta do emblema de centurião em sua camisa, da tatuagem SPQR em seu antebraço.
— Desculpe — murmurou ele — mas se ela é um espírito do vento, não poderia apenas... você sabe, flutuar?
O treinador fechou os dedos em torno do cabo de seu taco de beisebol.
— Normalmente sim. Mas veja... ela está em uma condição delicada. Não seria seguro.
— Condição delicada... — Os olhos de Frank se arregalaram. — Ela vai ter um bebê? Você vai ser pai?
— Grite um pouco mais alto — resmungou Hedge — acho que não ouviram você na Croácia.
Frank não pôde deixar de sorrir.
— Mas, treinador, isso é incrível! Um pequeno bebê sátiro? Ou talvez uma ninfa? Você será um pai fantástico.
Frank não sabia por que, considerando o amor do treinador por bastões de beisebol e chutes à Chuck Norris, mas tinha certeza que sim.
O treinador Hedge ficou com uma cara ainda mais feia.
— A guerra está a caminho, Zhang. Nenhum lugar é seguro. Eu deveria estar lá com Mellie. Se tiver de morrer em algum lugar...
— Ei, ninguém vai morrer — disse Frank.
Hedge olhou no fundo dos olhos do garoto. Ele podia ver que o treinador não acreditava nele.
— Sempre tive um fraco pelos filhos de Ares — resmungou Hedge — ou Marte, como queira. Talvez por isso não o tenha pulverizado por fazer tantas perguntas.
— Mas eu não estava...
— Tudo bem, vou lhe contar! — Hedge suspirou novamente. — Quando eu estava em minha primeira missão como investigador, no interior do Arizona, trouxe uma menina chamada Clarisse.
— Clarisse?
— Sua irmã — disse Hedge. — Filha de Ares. Violenta. Rude. Muito potencial. Enfim, enquanto estava fora, sonhei com a minha mãe. Ela... ela era uma ninfa do vento, como Mellie. Sonhei que ela estava em perigo e precisava de minha ajuda imediata. Mas eu disse a mim mesmo: Não, é apenas um sonho. Quem faria mal a uma velha e doce ninfa do vento? Além disso, preciso levar esta meio-sangue para um lugar seguro. Então, terminei a minha missão, levei Clarisse para o Acampamento Meio-Sangue. Depois, fui à procura de minha mãe. Era tarde demais.
Frank observou o tufo de pelo de bode pousar sobre uma bola de basquete.
— O que aconteceu com ela?
Hedge deu de ombros.
— Não faço ideia. Nunca mais a vi. Talvez, se estivesse com ela, se eu tivesse voltado mais cedo...
Frank queria dizer algo reconfortante, mas não tinha certeza do quê. Perdera a mãe na guerra do Afeganistão e sabia quão vazias as palavras sinto muito podiam soar.
— Você estava fazendo o seu trabalho — disse Frank — salvou a vida de uma semideusa.
— Agora — resmungou Hedge — minha mulher e meu filho ainda não nascido estão em perigo, do outro lado do mundo, e nada posso fazer para ajudar.
— Você está fazendo.  Estamos aqui para impedir que os gigantes despertem Gaia. Essa é a melhor maneira de manter nossos amigos a salvo.
— É. É, acho que sim.
Frank queria poder fazer mais para animar Hedge, mas aquela conversa estava fazendo com que se preocupasse com todos os outros que deixara para trás. Ele se perguntou quem estaria defendendo o Acampamento Júpiter agora que a legião marchara para leste, especialmente com todos os monstros que Gaia estava libertando pelas Portas da Morte. Ele se preocupava com seus amigos na Quinta Coorte, e como deveriam estar se sentindo com Octavian ordenando-os a marchar contra o Acampamento Meio-Sangue. Frank queria estar lá, nem que fosse para enfiar um ursinho de pelúcia na garganta daquele áugure desprezível.
O navio embicou. O equipamento esportivo rolou para baixo do beliche do treinador.
— Estamos descendo — disse Hedge. — É melhor subirmos ao convés.
— Sim — disse Frank, com a voz rouca.
— Você é um romano intrometido, Zhang.
— Mas...
— Vamos lá — disse Hedge. — E nem uma palavra sobre isso para os outros, seu fofoqueiro.

* * *

Enquanto os outros fixavam as amarras aéreas, Leo pegou Frank e Hazel pelos braços. Ele os arrastou até a balista de proa.
— Muito bem, eis o plano.
Hazel estreitou os olhos.
— Eu odeio os seus planos.
— Preciso daquele graveto mágico — disse Leo — rápido!
Frank quase engasgou com a própria língua. Hazel recuou, cobrindo instintivamente o bolso do casaco.
— Leo, você não pode...
— Encontrei uma solução — Leo voltou-se para Frank — a decisão é sua, grandalhão, mas posso protegê-lo.
Frank pensou em quantas vezes vira os dedos de Leo explodirem em chamas. Um movimento em falso e ele poderia incinerar o pedaço de lenha que controlava a vida de Frank. Mas, por algum motivo, Frank não estava aterrorizado. Desde que enfrentara os monstros bovinos em Veneza, ele mal pensara em sua frágil linha da vida. Sim, qualquer fagulha poderia matá-lo. Mas também sobrevivera a algumas coisas impossíveis e orgulhara seu pai. Frank decidira que, não importava qual fosse o seu destino, não se preocuparia com aquilo. Faria apenas o melhor que pudesse para ajudar os amigos.
Além disso, Leo parecia sério. Seus olhos ainda estavam repletos de uma estranha melancolia, como se estivesse em dois lugares ao mesmo tempo, mas nada em sua expressão indicava qualquer tipo de brincadeira.
— Vá em frente, Hazel — disse Frank.
— Mas... — Hazel suspirou profundamente. — Tudo bem.
Ela pegou o pedaço de lenha e entregou-o para Leo.
Nas mãos de Leo, não parecia muito maior do que uma chave de fenda. A lenha ainda estava carbonizada em um lado, usado por Frank para queimar as correntes de gelo que prendiam o deus Tânatos no Alasca.
De um bolso de seu cinto de ferramentas, Leo tirou um pedaço de pano branco.
— Vejam!
Frank fez uma careta.
— Um lenço?
— Uma bandeira de rendição? — adivinhou Hazel.
— Não, homens de pouca fé! — disse Leo. — Esta bolsa é feita com um tecido muito legal, presente de uma amiga.
Leo guardou o pedaço de lenha na bolsa e fechou o cordão de bronze com um laço.
— O cordão foi ideia minha — disse Leo com orgulho — deu algum trabalho adaptá-lo ao tecido, mas a bolsa não abrirá a não ser que você queira. O tecido respira como pano comum, de modo que a lenha não ficará mais abafada do que estaria no bolso do casaco de Hazel.
— Hum... — disse ela. — Então, qual a novidade?
— Segure isso para você não enfartar.
Leo jogou a bolsa para Frank, que quase a deixou cair no chão. Em seguida invocou uma bola de fogo branco em sua mão direita. Estendeu o antebraço esquerdo, sorrindo, enquanto as chamas lambiam a manga de seu casaco.
— Estão vendo? — disse ele. — Não queima!
Frank não queria discutir com um sujeito que segurava uma bola de fogo, mas respondeu:
— Hã... você é imune às chamas.
Leo revirou os olhos.
— Sim, mas tenho que me concentrar para que minhas roupas não queimem. E eu não estou me concentrando, viu? Esse pano é totalmente à prova de fogo. O que significa que sua lenha não queimará dentro dessa bolsa.
Hazel não parecia convencida.
— Como você pode ter certeza?
— Nossa, que público incrédulo — Leo apagou o fogo — creio que só há uma maneira de convencê-lo.
Ele estendeu a mão para Frank.
— Ah, não, não.
Frank recuou. Subitamente, todos aqueles pensamentos corajosos sobre aceitar seu destino pareceram-lhe muito distantes.
— Tudo bem, Leo. Obrigado, mas eu... eu não posso...
— Cara, você precisa confiar em mim.
O coração de Frank disparou. Será que confiava em Leo? Bem, com certeza... com um motor. Para dar um trote. Mas com a sua vida?
Lembrou-se do dia em que ficaram presos na fábrica subterrânea em Roma. Gaia prometera que morreriam naquele lugar. Leo prometera que tiraria Hazel e Frank daquela armadilha. E tirou. Agora, Leo falava com a mesma confiança.
— Muito bem — Frank entregou a bolsa para Leo — tente não me matar.
A mão de Leo se encheu de chamas. A bolsa não escureceu nem queimou.
Frank esperava que algo desse terrivelmente errado. Contou até vinte, mas ainda estava vivo. Sentia-se como se houvesse um bloco de gelo derretendo logo atrás de seu esterno, um pedaço de medo congelado ao qual estava tão acostumado que nem sequer se dera conta dele até ter desaparecido.
Leo apagou o fogo. Ele levantou as sobrancelhas para Frank.
— Quem é o seu melhor amigo?
— Não responda esta pergunta — disse Hazel — mas, Leo, isso foi incrível.
— Foi, não é? — concordou Leo. — Então, quem quer ficar com este agora-ultra-seguro pedaço de lenha?
— Eu fico — disse Frank.
Hazel pressionou os lábios. Olhou para baixo para que Frank não visse a mágoa em seus olhos. Ela protegera aquele pedaço de lenha por uma série de árduas batalhas. Era um sinal de confiança entre eles, um símbolo de seu relacionamento.
— Hazel, não é por sua causa — Frank falou, tão delicadamente quanto podia — não posso explicar, mas eu... eu tenho a impressão de que precisarei tomar a iniciativa quando estivermos na Casa de Hades. Preciso carregar o meu próprio fardo.
Os olhos dourados de Hazel estavam repletos de preocupação.
— Entendo. Eu só... me preocupo.
Leo jogou a bolsa para Frank, que amarrou-a ao cinto. Sentia-se estranho carregando seu defeito fatal tão abertamente, depois de meses mantendo-o escondido.
— Leo — chamou ele — obrigado.
Parecia pouco considerando o presente que lhe dera, mas Leo sorriu.
— Para isso que servem os amigos superdotados.
— Ei, pessoal! — gritou Piper da proa. — É melhor virem até aqui. Vocês precisam ver isso.

* * *

Eles encontraram a origem do raio negro.
O Argo II pairava diretamente sobre o rio. A poucas centenas de metros dali, no topo da colina mais próxima, havia um grupo de ruínas. Não pareciam grande coisa, apenas alguns muros desmoronados circundando as estruturas calcárias de um punhado de edifícios, mas, de algum lugar dentro das ruínas, tentáculos de éter negro erguiam-se em direção ao céu, como uma lula de fumaça espreitando de sua caverna. Enquanto Frank observava, um raio de energia negra cortou o ar, balançando o navio e lançando uma onda de choque fria por toda a paisagem.
— O Necromanteion — disse Nico. — A Casa de Hades.
Frank se equilibrou apoiando na amurada. Imaginou que era tarde demais para sugerir que desistissem e estava começando a sentir uma certa nostalgia quanto aos monstros que enfrentara em Roma. Droga, caçar vacas venenosas em Veneza era mais legal do que aquele lugar.
Piper se abraçou.
— Eu me sinto vulnerável flutuando aqui assim. Não podemos pousar no rio?
— Não é uma boa ideia — disse Hazel. — Este é o Rio Aqueronte.
Jason estreitou os olhos, ofuscado pela luz do sol.
— Eu achava que o Aqueronte corria no Mundo Inferior.
— E corre — Hazel respondeu — mas a sua nascente fica no mundo mortal. Este rio abaixo de nós? Flui para o subsolo, direto para o reino de Plutão... hã, de Hades. Desembarcar um navio de semideuses nessas águas...
— Sim, vamos ficar aqui em cima — decidiu Leo — não quero água zumbi no meu casco.
Meio quilômetro rio abaixo, navegavam alguns barcos de pesca. Frank imaginou que os pescadores não sabiam ou não se importavam com a história daquele rio. Deve ser legal ser um mortal comum.
Ao lado de Frank, Nico di Angelo ergueu o cetro de Diocleciano. Sua orbe brilhou com luz roxa, como se em sinal de solidariedade com a tempestade escura. Relíquia romana ou não, o cetro incomodava Frank. Se realmente tinha o poder de convocar uma legião de mortos... bem, Frank não tinha certeza se aquilo era uma ideia tão boa assim.
Certa vez, Jason lhe dissera que os filhos de Marte tinham uma habilidade similar. Supostamente, Frank poderia invocar soldados fantasmas do lado perdedor de qualquer guerra para servi-lo. Nunca tivera muita sorte com esse poder, provavelmente porque aquilo o assustava bastante. Tinha medo de se tornar um dos fantasmas caso perdesse a guerra, eternamente condenado a pagar por seus fracassos, supondo que sobraria alguém para invocálo.
— Então, hã, Nico... — Frank apontou para o cetro. — Você aprendeu a usar esse treco?
— Vamos descobrir — Nico olhou para os tentáculos de escuridão que emanavam das ruínas — não pretendo tentar até ser necessário. As Portas da Morte já estão fazendo hora extra para trazerem os monstros de Gaia. Qualquer atividade a mais para trazer os mortos de volta e as Portas podem ruir permanentemente, abrindo uma fenda no mundo mortal que não poderá ser fechada.
— Odeio fendas no mundo — resmungou o treinador Hedge — vamos cortar algumas cabeças de monstros.
Frank olhou para a expressão sombria do sátiro. Subitamente, teve uma ideia.
— Treinador, você deve ficar a bordo. Proteja-nos com as balistas.
Hedge fez uma careta.
— Ficar para trás? Eu? Mas sou seu melhor soldado!
— Podemos precisar de apoio aéreo — disse Frank — como fizemos em Roma. Você salvou as nossas braccae.
Ele não acrescentou: além disso, gostaria que voltasse vivo para a sua mulher e para o seu bebê. O treinador aparentemente entendeu a mensagem. Sua carranca relaxou. Seus olhos pareceram aliviados.
— Bem — resmungou — suponho que alguém tenha de salvar as suas braccae.
Jason deu um tapa no ombro do treinador. Então, meneou a cabeça para Frank, agradecido.
— Então, está combinado. Todos os demais, vamos para as ruínas. É hora de estragar a festa de Gaia.

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