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O Herói Perdido - CAP. 11

.. domingo, 31 de março de 2013

Capítulo XI - Leo


LEO NÃO FICOU RODEANDO PIPER depois de sua transformação. Claro que ela estava incrível e tudo mais — Ela usa maquiagem!  Que milagre! — mas Leo tinha problemas para cuidar. Ele saiu do anfiteatro e correu na escuridão, pensando no que havia se metido.
Ele levantou em frente de um grupo de bravos e fortes semideuses e voluntariou-se — voluntariou-se — a uma missão que provavelmente o mataria.
Ele não mencionou sobre ter visto Tía Callida, sua antiga babá, mas assim que ele ouviu sobre a visão de Jason — a senhora de vestido preto e xale — Leo soube que era a mesma mulher. Tía Callida era Hera. Sua babá do mal era a rainha dos deuses. Coisas assim realmente podiam fritar seu cérebro.
Caminhou desolado para o bosque e tentou não pensar sobre sua infância, em todas as confusões que terminaram na morte de sua mãe. Mas ele não pôde deixar de pensar.

Na primeira vez que Tía Callida tentou matá-lo, ele devia ter uns dois anos. Tía Callida estava tomando conta dele enquanto sua mãe estava na oficina mecânica. Ela não era realmente sua tia, e claro — só uma das velhinhas na comunidade, uma tia genérica que ajudava a observar as crianças. Ela cheirava a presunto e sempre vestia um vestido de viúva com um xale preto.
— Vamos colocá-lo para tirar uma soneca — ela disse. — Vamos ver se você é mesmo meu corajoso pequeno herói, hein?
Leo estava sonolento. Ela aninhou-o num cobertor, depois em um monte quente... de cobertores vermelhos e amarelos? A cama era como um cubículo na parede, feita de tijolos enegrecidos, com uma fenda em metal sobre sua cabeça e um buraco quadrado muito acima, onde ele podia ver as estrelas. Ele lembrou descansar
confortavelmente, agarrando faíscas como vaga-lumes. Ele repousou, e sonhou com um barco feito de fogo, a navegar pelas cinzas. Ele imaginou-se a bordo, navegando pelo céu. Em algum lugar próximo, Tía Callida sentava na sua cadeira de balanco — nhec, nhec, nhec — e cantava uma cancão de ninar. Mesmo com dois anos, Leo sabia a diferença entre inglês e espanhol, e se lembra de ter ficado confuso porque Tía Callida estava cantando numa linguagem que era desconhecida.
Tudo estava bem até sua mãe vir para casa. Ela gritou e correu para pegá-lo, gritando para Tía Callida:
— Como você foi capaz?
Mas a velha senhora desapareceu.
Leo se lembra de olhar sobre o ombro da mãe, para as chamas ondulando ao redor dos seus cobertores. Só anos depois ele percebeu que estava dormindo numa lareira ardente.
A coisa mais estranha? Tía Callida não foi presa nem sequer banida da casa deles. Ela apareceu novamente várias vezes nos anos seguintes. Quando Leo tinha três anos, ela o deixou brincar com facas.
— Você deve aprender a lidar com lâminas cedo — ela insistia — se você for meu herói algum dia.
Leo conseguiu não morrer, mas ele teve a sensação de que Tía Callida não teria se importado de um jeito ou de outro.
Quando Leo tinha quatro, Tía encontrou uma cascavel num pasto próximo. Ela deu para ele uma vara e encorajou-o a atiçar o animal.
— Onde está sua bravura, pequeno herói? Mostre-me que as Parcas estão certas ao  escolher você.
Leo olhou para aqueles olhos cor-de-âmbar, ouvindo o seco shh-shh-ssh do chocalho da cobra. Ele não era capaz de atiçá-la. Não parecia justo. Aparentemente, a cobra sentia o mesmo sobre picar uma criança pequena. Leo podia jurar que ela olhava para Tía Callida como se dissesse, Você é louca, senhora? Em seguida, ela desapareceu na grama alta.
A última vez que ela cuidou dele foi quando Leo tinha cinco anos. Ela trouxe-lhe um pacote de carvão e um bloco de papel. Eles sentaram juntos na mesa de piquenique atrás do condomínio, sob uma antiga árvore. Enquanto Tía Callida cantava suas estranhas músicas, Leo desenhava uma pintura do barco que ele vira em chamas, com velas coloridas e fileiras de remos, uma popa curvada, e um mastro impressionante. Quando estava quase acabando, prestes a assinar seu nome do jeito que aprendeu no jardim de infância, uma ventania arrebatou o desenho. Ele voou para o céu e desapareceu.
Leo queria chorar. Ele gastou muito tempo naquele desenho — mas Tía Callida não fez nada além de soltar um suspiro, desapontada.
— Não é hora ainda, pequeno herói. Algum dia, você terá sua missão. Você encontrará seu destino, e sua dura jornada finalmente fará sentido. Mas primeiro você deve encarar muitas dores. Eu lamento por isso, mas heróis não podem ser moldados de um jeito diferente. Agora, me faça um fogo, hein? Esquente esses velhos ossos.
Alguns minutos depois, a mãe de Leo saiu e gritou em horror. Tía Callida havia partido, mas Leo estava sentado no meio de brasas. O bloco de papel estava reduzido a cinzas. Pedaços de carvão tinham derretido numa poça borbulhante de gosma multicolorida, e as mãos de Leo estavam flamejantes, queimando lentamente a mesa de piquenique. Por anos a fio, as pessoas no condomínio se perguntavam como as mãos de um menino de cinco anos de idade haviam ficado marcadas em dois centímetros e meio de profundidade na madeira maciça.

Agora Leo tinha certeza que Tía Callida, sua babá psicótica, era Hera todo o tempo. Aquilo a fazia, o que... sua avó divina? Sua família era ainda mais bagunçada do que ele imaginava.
Ele imaginava se sua mãe sabia da verdade. Leo se lembrou que depois daquela ultima visita, sua mãe o colocou para dentro e teve uma longa conversa com ele, mas ele só entendeu um pouco.
— Ela não pode voltar de novo. — Sua mãe tinha um rosto lindo com olhos gentis, e cabelos pretos encaracolados, mas parecia mais velha do que era por causa do trabalho duro. As linhas ao redor dos olhos estavam profundamente marcadas. Suas mãos eram cheias de calos. Ela era a primeira pessoa da família a ter pós-graduação da faculdade. Era graduada em engenharia mecânica e podia projetar qualquer coisa,
consertar qualquer coisa, construir qualquer coisa.
Mas ninguém queria contratá-la. Nenhuma companhia iria levá-la a serio, então ela acabou na oficina mecânica, tentando conseguir dinheiro suficiente para sustentar os dois. Ela sempre cheirava a óleo de máquina, e quando ela falava com Leo misturava espanhol e inglês constantemente como se uma língua completasse a outra. Levou anos para Leo perceber que nem todos falavam daquele jeito. Ela até ensinou-o o Código Morse como um tipo de jogo, então eles trocavam mensagens quando estavam em quartos diferentes: Eu te amo. Você está bem? Coisas simples assim.
— Não me importo com o que Callida diz — sua mãe lhe disse. — Não me importo sobre destino e as Parcas. Você é muito jovem para isso. Você ainda é o meu bebê.
Ela pegou as mãos dele, procurando marcas de queimaduras, mas naturalmente não havia nenhuma.
— Leo, ouça-me. Fogo é uma ferramenta, como tudo mais, mas é mais perigoso que o resto. Você não sabe seus limites. Por favor, me prometa... nada mais de brincadeiras com fogo até você conhecer seu pai. Algum dia, mi hijo, você irá conhecê-lo. Ele explicará tudo.
Leo ouvira aquilo desde quando ele podia lembrar. Algum dia ele conheceria o pai. Sua mãe não responderia perguntas sobre ele. Leo nunca o conheceu, nunca nem viu suas fotos, mas ela falava como se ele tivesse ido comprar leite e pudesse voltar a qualquer minuto. Leo tentava acreditar nela. Algum dia, tudo faria sentido.
Nos anos seguintes, eles foram felizes. Leo quase se esqueceu da Tía Callida. Ele ainda sonhava com o barco voador, mas os outros eventos estranhos pareciam como um sonho também.
Tudo mudou quando ele tinha oito anos. Por então, ele estava gastando toda hora livre na oficina com a mãe. Ele sabia como usar as máquinas. Ele podia medir e fazer contas melhor que a maioria dos adultos. Ele aprendeu a pensar tridimensionalmente, resolvendo problemas mecânicos de cabeça do jeito que sua mãe
fazia.
Uma noite, eles ficaram até mais tarde, pois sua mãe estava terminando um projeto de broca que ela esperava patentear. Se ela pudesse vender o protótipo, aquilo poderia mudar suas vidas. Ela finalmente teria descanso.
Enquanto trabalhava, Leo passava suas ferramentas e lhe contava piadas tolas, tentando manter o alto-astral. Ele adorava quando podia fazê-la rir. Ela sorria e dizia:
— Seu pai estaria orgulhoso de você, mi hijo. Você irá conhecê-lo em breve, tenho certeza.
O espaço de trabalho de sua mãe era nos fundos da oficina. Era um pouco assustador à noite, pois eles eram os únicos ali. Todos os sons ecoavam pelo galpão escuro, mas Leo não se importava desde que estivesse com a mãe. Se ele passeasse pela oficina, podiam se comunicar por Código Morse. Sempre que estavam prontos para ir, eles tinham que andar através de toda a oficina, pela sala de espera até o estacionamento, trancando as portas atrás deles.
Aquela noite depois de terminarem, eles chegaram à sala de espera quando sua mãe percebeu que não estava com as chaves.
— Engraçado. — Ela franziu. — Tenho certeza que peguei as chaves. Espere aqui, mi hijo. Volto em um minuto.
Ela deu-lhe mais um sorriso — o ultimo que ela daria — e voltou para o armazém.
Ela só havia ido a alguns batimentos cardíacos quando a porta interior se fechou. Então a porta exterior trancou-se.
— Mãe? — O coração de Leo batia forte. Algo pesado quebrou-se dentro do armazém. Ele correu para a porta, mas não importava com quanta força empurrasse ou chutasse, ela não abria. — Mãe! — Freneticamente, ele bateu uma mensagem na parede: Você está bem?
— Ela não pode ouvir você — uma voz disse.
Leo virou e encontrou-se encarando uma mulher estranha. A principio ele pensou que era Tía Callida. Ela estava enrolada em roupas negros, com um véu cobrindo seu rosto.
— Tía? — ele disse.
A mulher riu por entre os dentes, um lento som gentil, como se estivesse meio adormecida.
— Eu não sou sua babá. A mera semelhança é de família.
— O que... o que você quer? Onde está minha mãe?
— Ah... você é leal a mãe. Ótimo. Mas você entende, eu tenho filhos também... e eu entendo que você irá lutar com eles algum dia. Quando eles tentarem me despertar, você irá impedi-los. Eu não posso aceitar isso.
— Eu não te conheço. Eu não quero lutar com ninguém.
Ela murmurou como uma sonâmbula em transe:
— Uma sábia escolha.
Com um calafrio, Leo percebeu que a mulher estava, na verdade, adormecida. Por trás do véu, seus olhos estavam fechados. Porém o mais estranho ainda: suas roupas não eram feitas de tecido. Elas eram feitas de terra — lama seca e negra, agitando e mudando ao redor dela. Seu rosto adormecido e pálido era pouco visível atrás de uma cortina de pó, e ele teve a horrível sensação de que ela tinha acabado de se levantar do túmulo. Se a mulher estava adormecida, Leo queria que ela ficasse desse jeito. Ele sabia que completamente acordada, ela seria ainda mais terrível.
— Não posso te destruir ainda — a mulher murmurou. — As Parcas não permitirão. Mas elas não protegem sua mãe e não podem me impedir de quebrar seu espirito. Lembre-se dessa noite, pequeno herói, quando eles pedirem para você opor-se a mim.
— Deixe minha mãe em paz!
Medo cresceu na sua garganta enquanto a mulher arrastava-se para frente. Ela se movia mais como uma avalanche do que como uma pessoa, era uma parede escura de terra deslocando-se para ele.
— Como você irá me parar? — ela sussurrou.
Ela atravessou uma mesa, fazendo com que as moléculas do seu corpo se desintegrassem e voltassem a se juntar do outro lado. Ela pairou sobre Leo, e ele sabia que iria passar direto por ele, também. Ele era a única coisa entre aquela mulher e sua mãe.
As mãos de Leo pegaram fogo.
Um sorriso sonolento propagou-se pelo rosto da mulher, como se ela já houvesse ganhado. Leo gritou em desespero. Sua visão ficou vermelha. Chamas envolveram a mulher, as paredes, as portas trancadas. E Leo perdeu a consciência.
Quando ele acordou, estava numa ambulância.
A paramédica tentou ser bondosa. Ela lhe disse que o armazém havia sido queimado. Sua mãe não havia escapado. A paramédica disse que sentia muito, mas Leo não compreendia nada. Ele perdeu o controle, assim como sua mãe alertou. A morte dela era sua culpa.
A polícia logo chegou para pegá-lo, e eles não foram tão gentis. O incêndio começou na sala de espera, eles disseram, exatamente onde Leo estava. Ele sobreviveu por um milagre, mas que tipo de criança trancava as portas do escritório da mãe, sabendo que ela estava do lado de dentro, e começava um incêndio?
Mais tarde, seus vizinhos do condomínio contaram a polícia que estranho garoto ele era. Eles falaram sobre as marcas queimadas de mãos na mesa de piquenique. Eles sempre souberam que havia algo de errado com o filho de Esperanza Valdez.
Seus parentes não iriam cuidar dele. Sua tia Rosa o chamou de diablo e gritou para os assistentes sociais levarem-no. Então Leo foi para seu primeiro lar adotivo. Alguns dias depois, ele fugiu. Em algumas casas ficava mais tempo que em outras. Ele contaria piadas, faria alguns amigos, fingia que nada o incomodava, mas sempre acabava fugindo mais cedo ou mais tarde. Era a única coisa capaz de aliviar sua dor. Queria sentir-se em movimento, ficando cada vez mas longe das cinzas daquela oficina mecânica.
Ele prometeu a si mesmo que nunca mais brincaria com fogo novamente. Ele não pensou em Tía Callida ou na mulher que dormia envolta em roupas de terra por um longo tempo.

Ele estava quase na floresta quando imaginou a voz da Tia Callida: Não foi sua culpa, pequeno herói. Nosso inimigo se levanta. É hora de parar de fugir.
— Hera — Leo murmurou — você nem está aqui, está? Você está numa prisão em algum lugar.
Não houve resposta.
Mas agora, pelo menos, Leo entendia alguma coisa. Hera estivera observando-o durante toda a sua vida. De algum jeito, ela sabia que algum dia ela precisaria dele. Talvez aquelas Parcas que ela mencionou pudessem prever o futuro. Leo não tinha certeza.
Mas ele sabia que tinha que ir na missão. A profecia do Jason os alertava para tomar cuidado com a terra, e Leo sabia que tinha algo a ver com aquela mulher adormecida na oficina, enrolada em roupas de lama e pó.
Você encontrará seu destino, Tía Callida prometeu, e sua dura jornada finalmente fará sentido.
Leo podia entender o que aquele barco voador nos seus sonhos significava. Ele poderia conhecer seu pai, ou até conseguiria vingar a morte de sua mãe. Mas primeiro as coisas principais. Ele prometeu a Jason uma carona voadora.
Não o barco dos seus sonhos — ainda não. Não era hora de construir algo tão complicado. Ele precisava de uma solução mais rápida. Ele precisava de um dragão.
Ele hesitou na entrada do bosque, olhando para a escuridão absoluta. Corujas piavam alto, e algo muito distante silvava como um coro de serpentes.
Leo se lembrou do que Will Solace lhe disse: Ninguém deve entrar na floresta sozinho, definitivamente não desarmado. Leo não tinha nada — nenhuma espada, nenhuma lanterna, nenhuma ajuda.
Ele olhou por cima do ombro, para as luzes dos chalés. Ele podia dar meia-volta agora e contar para todos que ele estava brincando. Nyssa podia ir a missão em vez dele. Ele podia ficar no acampamento e aprender a ser parte do chalé de Hefesto, mas ele pensava quanto tempo demoraria a ele parecer seus companheiros de chalé — triste, abatido, convencido da sua própria má sorte.
Elas não podem me impedir de roubar o espírito de sua mãe, a mulher adormecida dissera. Lembre-se dessa noite, pequeno herói, quando eles pedirem para você opor-se a mim.
— Acredite em mim, senhora — Leo murmurou — eu lembro. E quem quer que você seja, vou te encarar duramente, ao estilo Leo.
Ele respirou profundamente e mergulhou no bosque.

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